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1 - Há momentos que ficam na memória. Portugal estreava-se no Europeu de 2000. Pela frente tínhamos a Inglaterra de Beckham. Alguns minutos depois do pontapé de saída já perdíamos por dois a zero. Os adeptos, no estádio ou em casa, frente à televisão, acomodavam-se já ao fado do costume. Foi quando um indivíduo feito de uma massa diferente decidiu fintar o destino. Alguém lhe passou a bola ainda no nosso meio campo, ele agarrou-a e conduziu-a, com rapidez, habilidade e determinação, por entre os ingleses. Ainda antes de chegar à grande área, num golpe de raiva, de força, de arte, desferiu um remate fortíssimo e colocado que resultou num golo espectacular [as imagens estão acessíveis a qualquer pessoa com ligação à Internet]. Mas o jogador não perdeu tempo com festejos. Manteve a expressão determinada, correu mais uns metros, até à baliza, agarrou na bola e voltou para trás, em direcção ao meio campo, arrastando os companheiros. Havia urgência em vencer. Quem estava a ver percebeu, naquela altura, que Portugal ia dar a volta. Foi este o momento que ficou na memória. Uma espécie de síntese do que foi, dentro de campo, esse fantástico jogador de futebol chamado Luís Figo.
2.O Ministério Público acusou Rui Pedro Soares, o "golden boy" da PT, e outros dois comparsas menores, Américo Thomati e João Carlos Silva, de corrupção passiva, por terem negociado um contrato de 750 mil euros com um futebolista famoso, em troca do seu apoio à candidatura de José Sócrates nas últimas eleições legislativas. O jogador cumpriu a sua parte do acordo, segundo os investigadores, quando se dispôs, no último dia de campanha, a tomar o pequeno-almoço com o cabeça-de-lista do PS. Para usar a terminologia da rapaziada que tão facilmente confunde interesse público com interesse partidário, foi uma coisa um bocado pornográfica. Os três gestores terão agora de responder pelo que fizeram em tribunal. Mas há quem escape por entre os pingos de chuva: em primeiro lugar o PS, principal beneficiário deste esquema de financiamente ilegal e imoral, cujos dirigentes vão assobiando para o lado como se nada tivessem que ver com o assunto; depois, o próprio futebolista, que pelos vistos nem sequer corre o risco de ter de devolver o prémio de jogo indevidamente recebido. Uma espécie de síntese do que foi, fora de campo, esse "pesetero" [a alcunha que lhe colocaram os adeptos do Barcelona quando saiu para o Real Madrid] chamado Luís Figo.