Perante uma situação difícil podemos ter a sensação de ser impossível que algo de mais grave nos aconteça. É a famosa expressão de "bater no fundo", usada com frequência, quantas vezes para caraterizar uma situação política e económica.
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Mas esta é muitas vezes uma sensação ilusória, face à volatilidade da noção do limite em que cremos estar. Foi assim, por exemplo, durante os tempos da intervenção externa em Portugal. Mas sentimos hoje o erro de avaliação, em especial quando a Grécia foi provando em cada mês exatamente o contrário. Percebemos que, afinal, a situação podia ter sido bem pior e que a firmeza do Governo acabou por ser benéfica a uma saída mais rápida do pesadelo.
Há muitos anos que a economia da Venezuela tem uma forte dependência da exportação de petróleo, principal fonte de riqueza do país, responsável por cerca de um terço do PIB e mais de metade do financiamento das despesas com a Administração Pública. A dependência excessiva do petróleo, associada à incapacidade de modernização do país, deu origem na década de 90 ao aparecimento de uma onda populista, que afinal fez com que o país empobrecesse de forma rápida e dramática. O que resta dos 30 milhões de habitantes não tem hoje acesso aos bens mais básicos, como água, medicamentos ou comida.
Num país que entre os anos 50 a 70 se mostrava ao Mundo como uma das economias mais florescentes, atraindo muita imigração com origem em Portugal e Espanha, bem mais pobres por esses tempos. Os fenómenos de corrupção formaram o caldo ideal para o aparecimento do justicialismo populista de Hugo Chávez. Que nos primeiros anos, beneficiando de preços altos do petróleo, teve tempos de alguma fartura, com a sua postura ditatorial e circense a ser tolerada em nome do "realpolitik".
Quando Chávez chegou ao poder a Venezuela tinha o segundo PIB per capita da região, apenas atrás da Argentina, para já não falar da época em que só era superada pelos EUA em todo o continente americano. A pobreza atinge agora patamares dramáticos de crise humanitária, simbolizada nos dados de 2017, em que quase dois terços da população perderam em média 11 quilos por desnutrição.
Tudo isto nos deve sempre, de novo, levar a questionar a nossa situação, em especial perante os vendedores de ilusões e promessas de amanhãs que cantam.
Prof. catedrático, vice-reitor da UTAD