Os governos centrais adotaram nos últimos anos uma peculiar forma de gerir. Todos querem deixar uma obra de regime que os perpetue na memória dos portugueses, nem sempre pelas melhores razões. O Governo socrático queria, porque queria, a Ota... Que, apesar de todos os milhões gastos em estudos, não saiu do papel, muito graças à intervenção da Associação Comercial do Porto e do seu estudo "Portela + 1", que deitou por terra os argumentos à época invocados. Agora, o Governo PSD/CDS ameaça com o novo porto do Barreiro, desativando o de Lisboa! Esta será mais uma obra faraónica que em nada beneficiará os portugueses, na medida em que os custos envolvidos em tal construção e manutenção tornarão inviável a sua rentabilização. No fim, serão os contribuintes do costume a ter de pagar a conta.
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Na verdade, a desativação de Lisboa e a construção do Barreiro parece-me mais "gato escondido com rabo de fora", pois irá obrigar à construção de novos acessos rodoviários, pontes e quem sabe novas ferrovias... Enfim, o lobby da construção parece que está de novo a atacar!
Mas alguém já pensou no investimento que vai ser necessário para dragar o rio Tejo, permitindo a sua navegabilidade a navios de contentores? E a manutenção da via fluvial que obrigará a dragagens anuais de dezenas de milhões de euros? Quem de direito, o Governo, ainda não respondeu a estas questões.
E por que não se equaciona, como a meu ver faria sentido, melhorar a capacidade instalada do porto de Setúbal, permitindo-lhe receber os navios que hoje atracam em Lisboa? Setúbal tem bons acessos, está numa zona central em termos de exportações e precisa de novos investimentos que potenciem a economia e o emprego local, até pelas carências sociais que infelizmente caracterizam esta região.
Este investimento em Setúbal não será tão pesado como um megaprojeto no Barreiro, como aparentemente o Governo se prepara para concretizar. O mesmo governo que, cumprindo um programa de austeridade, nos pediu tantos sacrifícios e tanta parcimónia mostrou na definição e realização de investimento público. Os nossos recursos financeiros não serão um bem escasso que justifique acautelar?
A concretizar-se este projeto, temo que toda a política portuária nacional fique em causa e se reequacionem investimentos que estão há muito previstos, programados e aprovados no porto de Leixões, mas que teimam em não sair do papel.
Esta infraestrutura, que este ano voltou a bater recordes no número de movimentos de contentores, é autossuficiente e tem um papel crucial nas exportações. Pelos vistos, ainda não mereceu a atenção dos nossos governantes ao ponto de se iniciarem as obras de ampliação do terminal Sul, bem como o aprofundamento do canal, permitindo aumentar ainda mais a sua competitividade.
Voltando ao início, a obra de regime no Barreiro não parece acautelar a racionalidade de recursos absolutamente necessária. Pelo que custa, pela inviabilidade económica e pelo impacto negativo em toda a política portuária nacional.
Em suma: pior que a Ota, só mesmo o Barreiro!