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O Governo tem um desafio monumental pela frente: pacificar a classe profissional dos polícias. Não é o único trabalho hercúleo que enfrenta, mas é talvez o mais crucial para a sua própria sobrevivência, ainda mais do que o apaziguamento dos profissionais da saúde. O leitor argumentará, com toda a justeza, que ter urgências fechadas é pior do que ter agentes da autoridade insatisfeitos. Do ponto de vista do cidadão, sem dúvida. Na perspetiva de um Governo periclitante, não será bem assim. Uma das características veladas de um Estado é o monopólio da violência legítima para manter a ordem pública, garantir a segurança ou aplicar a lei. Se os agentes desse monopólio - os polícias - estão constantemente preocupados com os seus próprios rendimentos e em protesto, quem fica em causa é, em primeira instância, o Governo em funções. Daí não ser de espantar que a tutela tenha proposto, já na fase final das negociações, um aumento de 300 euros mensais, pago 14 vezes, faseado a partir de 1 de julho de 2024, 1 de janeiro de 2025 e 1 de janeiro de 2026 (200 euros+50+50), para todos e cada um dos profissionais da PSP, GNR e guardas prisionais. Qualquer profissional, independentemente do setor económico em que atue, dirá que não é coisa pouca.
Os polícias são igualmente importantes para o Governo por motivos políticos. O Chega agarrou esta classe profissional como se fosse a sua última missão na Terra. Como diz Isaiah Berlin, o que todos querem não é só a liberdade de ação (até há sindicatos da classe), mas também o seu reconhecimento efetivo pela sociedade. O único risco para quem abraça politicamente a sua causa é o excesso de paternalismo e a colagem nada desinteressada.