Os polícias broncos, barrigudos e de palito ao canto da boca fazem parte da triste memória do ser português. Hoje, felizmente, a começar pela PSP, as forças de segurança dispõem de excelente preparação sob todos os capítulos. Como todas, a corporação dispõe de maçãs podres em número residual e, por isso, qualquer cidadão bem formado há muito deixou de olhar para os senhores e senhoras agentes como concorrentes sérios ao prémio da boçalidade. Dá-se até o caso de se lhes compreender algum descontentamento, sobretudo quando uma parte do seu trabalho é deitada ao lixo por excesso de garantias a ditar a libertação em tribunal de meliantes por si apanhados.
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Reforçada pelo modo exemplar como tem enquadrado o crescendo de manifestações populares e de revolta social contra as decisões governamentais, a boa imagem das forças policiais concede-lhes um crédito merecedor de ser bem gerido pelas suas organizações sindicais. E será uma pena esbanjarem- -no sob um olhar narcísico para os seus próprios umbigos.
Legítima, por estar enquadrada na lei, a manifestação de cerca de 4500 polícias que ontem desembocou na Assembleia da República é um caso exemplar de como se movimenta o descontentamento no fio da navalha.
O cilindro de austeridade opressiva contemplado pelo Orçamento do Estado de 2013 generaliza os sacrifícios e, por isso, nem os polícias lhe escapam. A suspensão da passagem à pré-aposentação, o fim dos transportes públicos gratuitos e o aumento dos encargos com o subsistema de saúde são algumas das decisões a abalar a estabilidade financeira e emocional dos agentes de autoridade.
Pressionante, a reação dos polícias é compreensível. Não foge, sequer, aos manuais em uso por outras classes socioprofissionais, também elas dispostas a reclamar ajustamentos, mas só se disserem respeito ao vizinho do lado. A universalidade do descontentamento não justifica, no entanto, igualdade de procedimentos nas reclamações.
Sim, os senhores e as senhoras polícias têm todo o direito de se sentir indignados. Como qualquer funcionário público, pensionista, membro da classe média a quem lhe vão aos bolsos ou desempregado sujeito ao emagrecimento mensal do subsídio, têm cabimento os esgares de preocupação e os gestos sintomáticos de azia nos senhores e nas senhoras polícias. Mas não vale tudo....
Ao reivindicarem um estatuto especial, os polícias acabam por ser os primeiros a marcarem um território de diferença. E conviria que puxassem dos galões num tal domínio.
Ao gritarem palavras de ordem contra o Governo do género "Gatunos! Gatunos!", os polícias (alguns) dão-se a um triste papel. Põem em xeque a boa imagem da corporação; vulgarizam-se. E como não consta terem detido algum membro do Governo, dão provas de uma inconveniente falta de eficácia. É caso para lhes pedir: tenham juízo!