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O presidente da República não confia numa solução política para a crise em que Portas ganha poder hierárquico, o controlo de áreas da governação que implicam as relações de Portugal com a troika e a tutela da agenda para o crescimento económico.
Não é preciso ter oráculos em São Bento ou em Belém para compreender qual é a natureza da rejeição que Cavaco manifestou aos portugueses sobre a remodelação do Governo proposta por Passos.
Em vez das análises sobre o diz que disse típicas dos corredores [e restaurantes] do poder, refaçamos a cronologia das três principais viagens do primeiro-ministro à Presidência da República.
Sabemos que Cavaco aceitou a primeira das soluções que Passos lhe apresentou para a demissão de Gaspar, a qual, em substância, é a mãe de todas as crises, tendo em conta o criticismo cínico com que o poderoso ministro das Finanças se despediu. Foi assim que Maria Luís Albuquerque acabou empossada, tendo o presidente da República revelado o detalhe de que recebera do primeiro-ministro a garantia formal de que sobre a nova ministra não pairava qualquer sombra de pecado, ou seja, que estava legalmente coberta no caso das famosas swaps.
Estava a nova ministra ainda a caminho da posse e o presidente da República ainda crente de que o primeiro-ministro tinha limitado os danos da saída de Gaspar e já os meios de comunicação social divulgavam a carta da demissão irrevogável do ministro dos Negócios Estrangeiros.
A demissão de Portas foi uma surpresa para Passos, que confessou isso mesmo em público, pelo que só pode ter sido uma surpresa ainda maior para o chefe de Estado.
Pequeno parêntesis: ser surpreendido é tudo o que um chefe de Estado não deve permitir que lhe aconteça. Não por si. Pelo Estado.
Na segunda viagem que fez a Belém, o primeiro-ministro levou ao presidente da República a informação de que o PSD e o CDS tinham chegado a um acordo para continuar a coligação e apoiar um novo Governo. E também sabemos que Cavaco não fez outra exigência que não fosse a de conhecer a natureza dessa reconciliação política, sendo certo que, entretanto, todo o aparelho político do CDS-PP esteve a ponto de se sublevar, por Portas não ter dado cavaco da sua demissão ao próprio partido.
Na terceira viagem a Belém, o primeiro-ministro levou um acordo PSD-CDS prolongado até às eleições europeias, uma remodelação com ministros credíveis ou aceitáveis em áreas antigas e novas e ainda um Portas redimido, promovido a vice-primeiro-ministro com a tutela da troika e da agenda para o crescimento. E foi esta solução que Cavaco achou fraca.
Qual é, então, a dúvida?!
Para o presidente da República, o ponto fraco é um Portas... forte.