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António José Seguro, antigo secretário-geral do PS, reapareceu em público e, nas vésperas do arranque da campanha para as legislativas, exteriorizou uma perplexidade. Porque motivo passou a ser tão difícil a formação de alianças partidárias? A ascensão do populismo, de esquerda ou de direita, contribui e muito para esse estado da arte. Os partidos populistas têm visões críticas em relação ao sistema democrático liberal e consideram as elites políticas como adversárias. A lógica é bipolar: nós contra os malvados dos corruptos. Ora, as elites, que ainda são monopólio dos partidos tradicionais, recusam fazer alianças com os “novos-ricos” da política, até para não darem a impressão que foram contagiados. “Não é não”, como disse Luís Montenegro a André Ventura.
À esquerda, já percebemos que uma geringonça 2.0 é, no mínimo, difícil.
Um caso paradigmático pode ser encontrado em Espanha. Alguns académicos identificaram o gatilho para o populismo na crise económica de 2008 e anos seguintes. Os escândalos de corrupção nos partidos tradicionais, nomeadamente no PP, incendiaram o populismo já latente. Hoje, o país vizinho tem um Governo liderado por um socialista, mas que está seguro pelos arames do populismo soberanista e regionalista.
Em Portugal, à crise financeira e programa de austeridade imposto pela troika, seguiu-se a prisão de José Sócrates, a queda do Governo de António Costa e, mais recentemente, o escândalo de alegada corrupção na Madeira. Apenas os dois partidos tradicionais foram afetados (PS e PSD). O Chega, que só nasceu em 2019, já é a terceira maior força e poderá crescer em 2024.
A rede tecida pelo populismo é, na realidade, uma “twilight zone” para onde são atraídos, mesmo que inadvertidamente, os partidos com história e os mais recentes que tentam entrar no sistema. Uma vez dentro dessa quinta dimensão, a saída é labiríntica e as alianças partidárias são inviáveis ou, tal como em Espanha, demasiado frágeis.