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Passos Coelho perdeu uma oportunidade de ouro para se fazer ouvir por todos os portugueses. Pelo contrário, a esquerda socialista perdeu uma oportunidade de ficar calada
Pedro Passos Coelho perdeu, na noite de sexta- feira, uma excelente oportunidade para se apresentar aos portugueses e dizer ao que vem. Com todos os holofotes sobre si, o novo líder do PSD preferiu, no discurso de vitória, garantir a unidade (em contraste com a purga de Ferreira Leite que o atingiu a ele mesmo) e prometer discutir Portugal (em contraste com os que chegam sabendo tudo). Foram cuidados demasiados. Compreensíveis, mas desperdiçando claramente uma tribuna e oportunidade irrepetíveispara nos dizer o que seria o país se ele e o PSD chegassem ao poder. Quando, daqui a mais ou menos 15 dias o Congresso (uff, mais um congresso!) o aclamar, o ambiente já será diferente: terá havido debates na Assembleia, onde o novo líder não tem assento e em que alguém por ele fará o discurso do "novo" PSD, terá havido conversas sobre a formação de listas ao Congresso (que darão a entender como Passos Coelho fará a unidade que promete) e, sobretudo, ter-se-á perdido "o" momento, aquele momento em que o líder fala pela primeira vez.
Não tendo pressa, Passos Coelho tem tempo para os combates com Sócrates e o PS. Ao prometer discutir Portugal, Passos Coelho está a querer ouvir para encontrar soluções. E o país precisa cada vez mais de quem lhe apresente alternativas. Não basta dizer que Sócrates está errado. Na crise actual é preciso que se diga o que se faria em vez de.
A crítica, ou aviso, como se queira, serve para o interior do PS. A esquerda socialista está incomodada com o PEC. Paulo Pedroso chega a dizer que o ministro das Finanças fala como Margaret Thatcher e que o PS é ultrapassado à esquerda por Bagão Félix. Cravinho vai no mesmo sentido. Mas, onde estão as propostas alternativas? Bastará, como faz Alegre, citar Jorge Sampaio e dizer que há vida para além do défice? Claro que há. O problema é outro.
Ferro Rodrigues, que esta semana também alinha algumas críticas, começa por querer aliviar o colete de forças em que estamos envolvidos e pergunta se a meta que a Europa estabeleceu para 2013 não seria mais realista se colocada em 2015. Claramente. O problema é que está fixada em 2013. O problema é que dizer-se que há vida para além do défice não pode querer dizer que podemos continuar a gastar de mais. Isso é mentira. Alguém vai ter de pagar e, como não há dinheiro, temos de cortar despesa. Onde? A esquerda do PS vai dizendo que não se pode colocar um tecto nas transferências de verbas do Orçamento para a Segurança Social. Compreende-se esta preocupação, que visa evitar que sejam os que mais dificuldades têm a fazer o maior sacrifício; mas mesmo aqui, e apesar da concordância, é preciso fazer contas e dizer onde se vai buscar o dinheiro em falta.
O facto é que há muito que na política portuguesa se vive apenas para criticar. Não chega. Passos Coelho perdeu uma oportunidade de ouro para se fazer ouvir por todos os portugueses. Se o fez porque quer estar mais bem preparado, dominar melhor os dossiês e porque quer solidificar alternativas à política socialista, esse pode ser um bom sinal. Pelo contrário, a esquerda socialista perdeu uma oportunidade de ficar calada: não tendo tido a força de promover um debate no interior do partido, não tendo alternativas concretas a este PEC, prefere o "sound byte" de comparar Teixeira dos Santos a Margaret Thatcher. É pobre, como alternativa interna, até porque, como acaba por reconhecer Ferro Rodrigues, "a credibilidade internacional e a confiança interna são dois aspectos imprescindíveis para o êxito do PEC".