Corpo do artigo
Assistimos durante dias consecutivos ao tributo que o país prestou a Mário Soares, se calhar até com momentos em que talvez se tenha ultrapassado um pouco os limites no exagero e redundância do interesse de algumas das notícias. Pelo meio vimos também alguma acrimónia nalguns setores da sociedade, com reflexos nas redes sociais, em boa parte com evidência do reavivar de memórias ligadas ao processo de descolonização. A história não volta para trás e com mais tranquilidade todos percebemos hoje que infelizmente o regime tinha deixado apodrecer a situação até um ponto de não retorno.
Como registo de interesses devo referir que nunca votei em Mário Soares, fosse em eleições legislativas, ou presidenciais. Mesmo na sua reeleição para presidente, após um mandato muito positivo e em que o seu opositor não me merecia qualquer crédito, confesso que não me esforcei sequer por ir votar, algo de que não me orgulho. Na sua primeira eleição para a Presidência da República fui um dos iludidos com Freitas do Amaral, personagem que felizmente a história veio a demonstrar de quanto o país ganhou com a sua derrota. Estou por isso à vontade com o que vou dizer.
Estou profundamente grato a Mário Soares! E a gratidão é para a vida e sempre resistente a pequenos incidentes de percurso. A sua luta contra o totalitarismo, fosse qual fosse a sua forma e origem, que na fase pós-25 de Abril pude testemunhar é, por si só, um facto notável e com consequências que felizmente perduram. O seu esforço notável em integrar-nos numa Europa que nos tratava entre o desdém e o ostracismo fica também como um marco indelével da sua passagem pela vida. Acresce que em grande parte a sua vida foi partilhada com outro ser absolutamente notável, a dr.ª Maria Barroso. Em 2003, como responsável máximo da Agência de Inovação e em representação do Governo, tive o privilégio de durante alguns dias partilhar o seu pensamento e forma de estar na vida, durante uma cimeira em Oviedo destinada a premiar uma das nossas melhores investigadoras em saúde, a doutora Maria do Carmo Fonseca. Que delícia e com que lições de vida me brindou a dr.ª Maria Barroso, das quais retenho em especial a mais notável da sua relação e aproximação a Deus.
Por isso o meu obrigado e a minha gratidão eterna ao dr. Mário Soares.
PROFESSOR CATEDRÁTICO DA U. PORTO