<p>O emérito presidente do PP considera o Rendimento Social de Inserção (RSI) um "financiamento à preguiça". Tradução: uma boa parte dos que recebem esta ajuda são calaceiros incorrigíveis, gente incapaz de se levantar cedo da cama para correr atrás de um emprego, uma cambada de inúteis que gasta o RSI a beber cerveja na tasca do bairro enquanto joga à sueca. Irresponsáveis que malbaratam o dinheiro dos contribuintes. </p>
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Uma parte deste retrato traçado por Paulo Portas corresponde à verdade, por muito que isso custe aos mais empedernidos esquerdistas. A prová-lo está o elevado volume de fraudes encontradas na distribuição do RSI. Sucede que há outra parte do mesmo retrato que não passa de uma mentira: o RSI é fundamental para a sobrevivência, em patamares minimamente aceitáveis, de muitas famílias portuguesas. E é por isso que parece tão deslocada - e populista - a expressão encontrada por Portas para o catalogar: um "financiamento à preguiça".
Se quiser entrar por esse caminho, o líder do PP terá que dizer o mesmo do subsídio de desemprego. É que também aqui há muitos preguiçosos que passam a vida a encontrar expedientes dos mais diversos para prolongarem até ao limite a prestação que lhes cabe em sorte. Ou dos pequenos e médios empresários que gastam mal as ajudas que lhe são dadas. Ou dos agricultores (classe que Portas particularmente aprecia) que compram tractores novos com o dinheiro que deveria servir para reconverter a vinha...
O que propõe o líder do PP para eliminar os "preguiçosos"? Propõe que uma parte do RSI passe a ser entregue em "géneros". Isto é: em vez do pilim, os beneficiários receberiam, por exemplo, latas de atum, pacotes de arroz e massa, leite e derivados e restantes produtos essenciais para o quotidiano dos mais necessitados. Como se faria isto, quanto custaria isto, quem forneceria os "géneros" e outros pequenos pormenores como estes não foram explicados por Paulo Portas.
Mais: o líder do PP propõe ainda que se retirem cerca de 125 milhões de euros do bolo do RSI, encaminhando essa verba para as pensões mínimas e sociais. Basicamente, Paulo Portas propõe a extinção pura e simples do Rendimento Social de Inserção. Só não o assume claramente, porque, nesta altura politicamente sensível, isso não lhe dá muito jeito.
Que há exageros e fraudes em ajudas e subsídios do tipo do RSI é uma evidência. Para os colmatar é necessária melhor fiscalização. Essa é a única forma de dar mais a quem mais precisa e penalizar quem abusa. O que não faz sentido em tempos de aguda crise é, por razões meramente ideológicas e de oportunismo político, retirar aos mais necessitados um pedaço das ajudas que lhes permitem viver só um bocadinho melhor.