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Expectativa. Outra vez. Está prometido para hoje um parto há muito esperado: o do guião da reforma do Estado. O especialista encarregado de o trazer à luz do dia não podia ser mais bem escolhido. Paulo Portas é, de longe, o elemento do Governo dotado de maior experiência e poder comunicacional. Sendo ele gingão na linguagem, capaz como ninguém de usar "sound bytes" impressionistas, convém ficar de atalaia......
O guião só pode estar consubstanciado numa de duas vias.
A primeira alternativa, a mais esperada, pode batizar-se de "música celestial". A apresentação de um calhamaço de generalidades político-ideológicas terá tudo para dar a impressão de se ter chegado a uma espécie de bússola orientadora - mesmo se não for percetível uma única linha estratégica nacional à distância de uma ou duas décadas. Sem conter propostas específicas e quantificadas, setor a setor, bastará o documento estar polvilhado de frases impactantes para gerar no país um debate estéril - apesar de histérico. O contributo servirá para puro entretenimento - e chicana política, de preferência "picando" o Partido Socialista.
Uma segunda via de apresentação é possível, embora pouco crível. Será muito mais bem-vista a apresentação de um documento enxuto, incisivo, especificando áreas alternativas ao atual modelo, explicando-as e quantificando os custos/benefícios de cada uma delas. Esperar um guião assim é, apesar de tudo, alinhar no otimismo excessivo. Trata-se de um esquisso impossível de realizar, com credibilidade, em meia dúzia de meses - além de conflituar nas diferenças estratégicas e ideológicas do PSD e CDS, os partidos da coligação governamental. Como na primeira das hipóteses, seria convergente só para acicatar o debate, de preferência "picando" o Partido Socialista.
Qualquer equação seguida por Paulo Portas no tão afamado guião da reforma do Estado terá zero de efeitos práticos. Só não será um "não assunto" pela óbvia gestação de jogadas no xadrez partidário....
Por mais virtuoso que seja, o guião da reforma do Estado estará completamente desalinhado do calendário das decisões para o país. Será um sofisma se se encaixar no projeto de Orçamento do Estado de 2014 em discussão na Assembleia da República; se contiver linhas de ação capazes de fazer o país refletir e decidir, elas jamais poderão ser levadas à prática antes de 2015. E o mandato do Governo (a correr bem) termina aí.
Mais assim ou mais assado, na melhor das hipóteses, o guião da reforma do Estado está fadado a constituir-se num mero testamento político deste Governo.
O país merecia mais. Muito mais.