A semana foi pródiga em magistérios de influência: Mário Soares voltou a mostrar a costela de guerrilheiro e Cavaco Silva a de comentador.
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Numa Nação como a nossa, em que quase todos os ex-qualquer coisa se transformam em senadores, as palavras de um ex-presidente da República, e, por maioria de razão, as do que está em função, estão destinadas a ser manifestos prontos a usar no interior das suas tribos de origem.
Portanto, quando Soares declara que está na hora de denunciar o acordo com a troika, isso empurra ainda mais Manuel Alegre para os braços do Bloco de Esquerda e António José Seguro para os braços de Cavaco, para o caso de as contas de Vítor Gaspar desviarem tanto que haja a tentação de suprimir a democracia pluripartidária e termos por uns tempos um governo de salvação nacional. Que é o sonho de todos quantos têm um primo no fim das muitas filas de espera, a crescerem pelo motivo óbvio de que o Estado do centrão deixou de ter dinheiro para famílias numerosas.
Do mesmo jeito, quando Cavaco desata a comentar objetivos e taxas da errante euro-economia como se Portugal pudesse prometer crescer por si mesmo, é claro que elimina margem de erro ao dircurso de Passos Coelho e torna-o ainda mais refém do plano orçamental de Vítor Gaspar. O qual, como já sabemos, vai continuar inexorável sobre a prioridade a dar à redução dos custos, mesmo que seja à míngua de investimentos.
Na verdade, Passos e Seguro estão obrigados a silêncios e palavras em função dos silêncios e palavras dos senadores das suas tribos. Não é um exercício fácil porque os tempos são de caminhos retos e não de gincanas.
Deste ponto de vista, Paulo Portes surge completamente liberto das influências de senadores. E, verdade seja dita, merece esta paz da sua tribo. Não é preciso ter memória de elefante para encontar um par de duras decisões tomadas por Portas mas que colocaram o partido em ordem. Algumas quando ainda era um táxi-partido.
Portas está assim a percorrer em linha reta o caminho que o pode distinguir como alguém que não tem de ouvir os senadores, tentar conjugar as suas mundividências e apesar disso não atropelar a política real. Ou seja: fazer o que tem de ser feito sem olhar a quem.
Desde de o 25 de abril que Portugal é sociológica e culturalmente de Esquerda. E mesmo quando o bloco da Direita adregou importantes vitórias eleitorais, nunca conseguiu fixar ideais, nem ideias, nem criar uma rede de reprodutores de ideologia. Ora, é essa lacuna que Portas está a tentar prencher sem pressa e com a persistência de quem sabe que não tem ninguém nas suas costas a conspirar.
Portas vai bem. Só tem um perigo grande a vencer: os poderes fáticos abrigados pelo centrão.