Há já cinco anos, e quando se discutia a hipótese de construir o novo aeroporto de Lisboa na Ota, a Associação Comercial do Porto encomendou à Universidade Católica do Porto um estudo sobre o tema. O estudo, monitorizado por um conjunto importante de individualidades, entre as quais Miguel Cadilhe, debruçou-se então, não só sobre a questão da localização do aeroporto, mas também sobre a questão económica, avaliando os méritos comparativos da opção "Portela +1". Ou seja, foi feita à data uma análise custo/benefício em que se comparava a construção da Ota, como novo aeroporto de raiz, a construção de um aeroporto modular (que fosse sendo desenvolvido em função do crescimento da procura), e também a hipótese de manter a Portela e construir um segundo aeroporto complementar na Região de Lisboa.
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O estudo rejeitava a "opção" Ota, por razões técnicas e económicas que mais tarde viriam a ser reconhecidas, considerava Alcochete uma boa alternativa técnica onde seria possível construir um aeroporto modular, mas demonstrava que a Portela + 1 era a solução mais interessante, apontando a base do Montijo como a localização mais compatível para a construção do segundo aeroporto. A possibilidade de "sequencialização do investimento", a "segmentação do modelo de negócio em função das características da procura" (separação do tráfego das companhias aéreas de baixo custo do tráfego das companhias de bandeira) e a "rentabilização dos investimentos realizados na Portela", eram as vantagens apontadas pelo estudo. A ACP questionava, igualmente, a tese defendida pela ANA de que a capacidade da Portela estava próxima do esgotamento.
O mesmo estudo, que foi amplamente divulgado, acabaria por ser olimpicamente ignorado pelo Governo de então, que no entanto acabou por abandonar a Ota e por escolher o campo de tiro de Alcochete, defendido num outro estudo apresentado pela CIP. A ANA, cuja Administração ainda é a mesma, fez na altura ouvidos de mercador, invocando que a existência de dois aeroportos teria desvantagens por não criar sinergias. A TAP, que tanto tinha e tem a ganhar com essa opção, optou por alinhar com o coro, o mesmo vindo a suceder com uma grande parte da opinião pública. Eduardo Pitta faria eco do sentimento nacional, ao escrever que "a ACP mete o bedelho onde não é chamada. É bem certo que a vertigem da capital tolda os notáveis da Invicta".
Sabe-se que este Governo, tantas vezes acusado de não fazer reformas, logo anunciou que não iria avançar com o novo aeroporto, e encomendou um estudo sobre a localização ideal para o aeroporto complementar à Portela. Soube-se agora que há um plano de restruturação, elaborado pela ANA, que contempla o aumento da capacidade da Portela. Sim, exatamente a mesma capacidade que essa mesma Administração dessa mesma ANA considerara impossível de aumentar há cinco anos. E, como se sabe, entretanto o tráfego cresceu muito...... Na verdade, mudam os tempos e mudam as vontades. Quanto à nossa razão, diria apenas que "mais vale tarde do que nunca". A vertigem da capital, essa, continua bem viva e de boa saúde, toldada pela portofobia e pelo lisbocentrismo. É por isso, claro, que se defende agora que a ANA seja privatizada no seu todo. Pela nossa parte, continuaremos a defender que se o Governo quer privatizar os aeroportos, o pode e deve fazer em separado. A ANA é decerto um monopólio, mas tem a virtude de ser um monopólio público. O pior dos modelos será sempre o de um monopólio privado, que olhará apenas à maximização do lucro. Por muito que nos queiram calar, propondo uma intervenção regional na gestão do aeroporto Francisco Sá Carneiro, sabemos bem que, na hora da verdade, os privados terão sempre melhores instrumentos para cuidarem do seu benefício. Também sabemos a importância da concorrência, e acreditamos que se os aeroportos forem privatizados em separado, a probabilidade é que surja um maior número de interessados, porque o investimento num só aeroporto é muito menor do que o investimento necessário para os adquirir todos em bloco. Também nisso temos razão, e mais vale tê-la agora do que tarde de mais.