Portugal 2020: não há desculpas
Concluíram-se na última quarta-feira as negociações entre o Governo e a Comissão Europeia, com vista à aprovação do Acordo de Parceria para os fundos europeus que estarão disponíveis até 2020.
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É uma boa notícia para Portugal e cabe aqui elogiar o trabalho do ministro Poiares Maduro e do secretário de Estado Castro Almeida, sobretudo nesta reta final. Com o Portugal 2020, o país passa a dispor do instrumento que pode e deve ser a locomotiva de um processo de mudança que nos coloque, de uma vez por todas, na média europeia. Acabaram-se as desculpas!
Não estou certo de que a generalidade dos portugueses tenha consciência das virtudes e do potencial deste novo programa de financiamento plurianual, designadamente no que se refere ao calendário, quantidade e qualidade dos fundos.
Quanto ao calendário, Portugal acabou por ser um dos primeiros países a entregar e a fechar o acordo. Falta ainda a aprovação dos programas operacionais e regionais, mas espera-se que lá para o último trimestre deste ano tudo esteja a postos para os primeiros concursos. O interessante é que decorrem ainda até ao verão de 2015 projetos no âmbito do QREN, o que significa que haverá uma sobreposição temporal com o Portugal 2020, reduzindo-se assim o vazio que tradicionalmente afeta o investimento na transição de programas.
A adesão de novos países à União Europeia nos últimos anos fez temer a possibilidade de uma redução acentuada do esforço de coesão relativamente a Portugal. A verdade é que, apesar da pressão a leste, o valor global do pacote negociado é muito generoso, ascendendo a 21 mil milhões de fundos estruturais, a que acrescem cerca de 4 mil milhões do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural. Ou seja, durante sete anos o país terá um tónico para o investimento público da ordem dos 2% do PIB.
Mas as grandes novidades estão na qualidade do financiamento. Qualidade setorial e qualidade geográfica. O desenho do Portugal 2020, não estando naturalmente isento de críticas, reflete dois importantes e positivos princípios estruturantes: o de considerar o investimento em infraestrutura física uma prioridade negativa, por oposição ao investimento na competitividade, na coesão social e na utilização eficiente dos recursos; e o do reforço dos fundos a afetar às regiões menos desenvolvidas.
Esta alteração de trajetória na abordagem aos fundos estruturais não deixa de ser um reconhecimento do insucesso dos programas anteriores. Direi insucesso relativo. A verdade é que o défice de coesão que existia na década de oitenta, infraestruturas incluídas, era de uma dimensão dantesca. E muito se fez e recuperou. Agora, não há dúvida de que em termos de convergência do país com a média europeia tem-se andado para trás nos últimos anos, com a agravante de algumas das regiões terem mesmo divergido da média nacional, num acentuar da macrocefalia centrada na região de Lisboa que não deveria deixar político nenhum orgulhoso.
Na negociação do Acordo de Parceria, a Comissão Europeia foi muito clara relativamente à necessidade de mudar de vida. O investimento em estradas foi um bom exemplo, em que prevaleceu por fim a limitação dos novos projetos a situações de acesso e conectividade a áreas empresariais e logísticas. Por oposição, a parcela mais importante dos fundos terá de ser colocada ao serviço do aumento da competitividade e da produtividade na economia nacional. As universidades, por exemplo, terão acesso a um montante global de mil milhões, mas a sua utilização terá de privilegiar a transferência de conhecimento para as empresas.
A prevalência dos desequilíbrios regionais também não deixa Bruxelas indiferente. A resposta portuguesa foi a afetação de 93% dos fundos às regiões menos desenvolvidas (Norte, Centro, Alentejo e Açores). Muito positivo. Importa agora que os vícios do passado, que incluem um extenso portefólio de práticas pouco abonatórias das intenções do regime mais centralista da Europa, não venham inverter o espírito do Portugal 2020.
Não sei se esta será a última oportunidade de aceder a fundos tão generosos. Sei, isso sim, que os portugueses não suportarão mais sete anos de agonia e centralismo. Não há desculpas, Portugal não pode falhar.