Todos os anos, por esta altura, a Associação 25 de Abril dá um sinal de vida, não vá o povo ser ingrato e incapaz de reconhecer o mérito de um naipe de protagonistas e responsáveis pela queda em 1974 de quase cinco décadas de ditadura em Portugal.
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Para uma boa parte de historiadores a instauração do regime democrático deu-se em Novembro e não em Abril. Não existindo unanimidade, aceita-se, porém, o pelo na venta dos jovens militares de então como instigadores de um novo tempo em Portugal. Os DDD - Democratizar, Descolonizar, Desenvolver - fizeram parte de todo um programa para o qual é ainda hoje impossível proceder a um balanço definitivo.
Descontados os erros de percurso, os militares de Abril merecem, pois, uma vénia pelo seu comportamento de então. O que não legitima um cheque em branco passado para todos os seus comportamentos, manobrados entre flores de estufa e o pseudomoralismo.
Sob o lema "Abril não desarma", o manifesto ontem divulgado pela associação para justificar a não participação amanhã nos atos oficiais nacionais evocativos do 38.oº aniversário do 25 de Abril é paradigmático de como os agora anafados militares mantêm tendência para se imiscuir na vida do país, não obstante proclamarem que "hoje como ontem, não pretendem assumir qualquer protagonismo político".
Uma tal conclusão é extraordinária, roça a desfaçatez, quando apelam à "unidade patriótica para salvar Portugal, a liberdade e a democracia", um repto que "não visa as instituições de soberania democráticas, não pretendendo confundi-las com os que são seus titulares e exercem o poder". Como se as instituições existissem sem personagens de carne e osso e como se estas não estivessem a exercer funções por absoluta legitimidade derivada da soberania do voto do povo!
A Associação 25 de Abril tem, naturalmente, todo o direito de criticar o poder instituído e de dar voz ao sentimento maioritário da sociedade, segundo o qual "as medidas e sacrifícios impostos aos cidadãos portugueses ultrapassaram os limites do suportável", como salientou Vasco Lourenço. Não pode é extrapolar do descontentamento a ideia de o atual poder estar a ser exercido tendo por base um golpe baixo, no presente ou no futuro próximo. Não é risível. É próprio de quem mantém tiques dispensáveis.
Está-se mesmo a ver: o povo choramingará tanto amanhã pelos cantos à falta dos militares e respetiva associação nas comemorações oficiais do 25 de Abril, como tremerá com a ideia plasmada no manifesto de que os seus subscritores têm "plena consciência da instituição militar, como recurso derradeiro nas encruzilhadas decisivas da História".
Ora, ora. O respeito pelos militares do 25 de Abril pressupõe que eles se deem também ao dito cujo. O que os obrigará, provavelmente, a concentrarem-se para além do bridge - merecedor de espaço próprio no "site" da Associação - que, como é público e notório, faz parte dos gostos das classes mais desfavorecidas. Ao contrário da bisca lambida...