No ano passado foi lançado o Programa Creche Feliz, garantindo vagas gratuitas em creches para crianças nascidas a partir de 1 de setembro de 2021, inclusive.
Esta medida permite a muitos pais colocarem os seus filhos numa instituição, facilitando, por esta via, a conciliação entre a vida familiar e profissional. Junta-se ainda o impacto positivo que a frequência deste tipo de instituições tem para as crianças.
Porém, esta importante e positiva medida começou por se limitar às vagas disponíveis em creches das instituições do terceiro setor, deixando de fora milhares de crianças. A exclusão ficou a dever-se ao facto de o número de vagas ser bem inferior ao número de crianças abrangidas pela medida. Ou seja, ao invés de se procurar garantir vagas para todas as crianças que preenchiam os requisitos previstos na lei, preferiu-se - num viés ideológico - limitar a resposta apenas a algumas instituições, desperdiçando as vagas existentes no setor privado.
Foram várias as vozes que ecoaram a criticar esta inaceitável discriminação que deixaria milhares de crianças sem vaga, apenas por preconceito ideológico. O Governo não terá ficado indiferente a esta realidade e à pressão mediática gerada e anunciou o alargamento da medida às creches do setor privado. Mas, adotou um critério que está longe de repor a justiça que se exigia. Os pais só poderão inscrever as crianças que cumpram os critérios em creches do setor privado, depois de esgotadas as vagas existentes naquele concelho em instituições do terceiro setor. Em termos práticos, esta opção tem levado pais a terem de percorrer mais de 70 km, porque, havendo vagas em instituições do setor social, não poderão inscrever os seus filhos nas creches do setor privado, mesmo que estas se localizem mesmo ao lado de sua casa.
Ao privilegiar-se a ideologia, em detrimento da resposta aos problemas e necessidades destes pais, acaba por se prejudicar as pessoas. Sendo certo que esta medida tem um óbvio impacto financeiro, nem sequer essa questão ajuda a explicar ou a justificar esta opção do Governo. De facto, o financiamento de cada vaga ocupada não é mais dispendioso no privado do que nas creches do setor social. Razão pela qual se torna ainda mais incompreensível o modo como o Governo desenhou esta medida.
Assim, espera-se que o Governo volte a olhar para a realidade e tenha a coragem de corrigir esta iniquidade. É essencial aproveitar toda a capacidade instalada nas creches. Só assim será possível não deixar nenhuma criança para trás.
*Jurista
