<p>A avaliar pelo júbilo que tomou conta dos dirigentes europeus, mal o presidente checo aceitou, embora contrariado, dar o aval ao Tratado de Lisboa, dir-se-ia que a Europa acaba de dobrar o mais tormentoso dos cabos, estando agora em condições de rumar a bom porto, sem ventos contrários. Foram necessários dois referendos na Irlanda, até que o povo percebesse, sem sombra de dúvidas, o que fora decidido nos gabinetes. Foi necessário abrir excepções, como a da aplicação da Carta dos Direitos Fundamentais ao Reino Unido, à Polónia e, agora, também à República Checa para remover resistências. Tudo fica a postos, a nova arquitectura institucional vai permitir à União Europeia agir concertadamente e, mais importante, falar a uma só voz na arena internacional? Provavelmente (ainda) não. </p>
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Apesar do parto difícil, o menino nasceu saudável e já pode sair da maternidade. Falta encontrar quem tome conta dele - é aí que um novo desafio se coloca. O cargo de presidente do Conselho Europeu é demasiado apetecível para ser entregue a um qualquer. Ora é precisamente esse o risco que corre a União: desencantar uma personalidade que contente todas as sensibilidades, mas seja incapaz de conferir ao cargo o peso político que reclama.
Os primeiros sinais não são animadores, porque a distribuição de cargos (e aqui também entra o de Alto Representante para a Política Externa) obedece à lógica das capelas partidárias. Será por isso que os coelhos que têm saltado, supostamente à espreita da toca, tendem a tornar-se "lebres", como o antigo primeiro-ministro britânico Tony Blair, descartado antes mesmo de chegar à mesa das negociações.
Privada de líderes políticos fortes, de duas uma: ou a Europa se rende ao eixo Paris-Berlim, entregando a escolha à dupla Sarkozy-Merkel, ou procura acordos mais alargados, que necessariamente baixam a bitola da exigência para se tornarem consensuais. Nenhuma das alternativas garante que a personalidade eleita escape à condição de "mínimo denominador comum", expressão com que se chegou a caracterizar Durão Barroso, quando foi eleito para o primeiro mandato na Comissão Europeia, e que agora volta a ouvir-se.
Uma figura com tal perfil pode servir os interesses de alguns estados, mas não serve de todo a estratégia de afirmação da Europa no Mundo. Porém, como ontem notava, em artigo no "El País", Norman Birnbaum, prestigiado universitário norte-americano, Merkel não designará Schroeder, Berlusconi não quer ouvir falar em Amato, Sarkozy ignora Aubry e Strauss-Kahn. E nem Zapatero menciona o seu camarada Felipe Gonzalez. Os líderes europeus não estão, definitivamente, à procura de grandes talentos para o cargo.