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O tempo de reclusão, mais do que um castigo, deveria ser um tempo de recuperação da pessoa que cometeu crimes e de preparação para a sua reintegração na sociedade.
Quando se está doente, vai-se ao hospital até se recuperar a saúde. E, quando se sai, ninguém é tratado como um ex-doente - como tantas vezes recorda o padre João Gonçalves, coordenador nacional da Pastoral Penitenciária. No entanto, um indivíduo que passe pela cadeia fica considerado para sempre um ex-recluso, ou seja, a sociedade acredita muito pouco na capacidade regeneradora do sistema prisional. Salvo raras exceções, quem comete um crime, mesmo depois de ter cumprido a sua pena, é considerado criminoso para sempre.
Muitas vezes, por causa disso, pessoas que saem da cadeia são rejeitadas pela família, não encontram emprego e acabam por regressar às atividades criminosas. Os irmãos no crime são, nesses casos, os únicos que os acolhem. Assim não se consegue quebrar o círculo vicioso da reincidência. Para além disso, o tempo de reclusão, em vez de ser um tempo de reeducação para a vida, torna-se frequentemente numa aprendizagem de formas mais refinadas da criminalidade. Uma escola para o crime.
Devido a estas constatações, em alguns países europeus, nomeadamente no Norte da Europa, está a investir-se para retardar ao máximo a entrada de novos indivíduos no sistema prisional. Nestes países, quando as pessoas são colocadas em liberdade, também não as abandonam à sua sorte: são acompanhados desde o primeiro minuto e são-lhes dadas condições para que não voltem a enveredar pelo crime. O objetivo é que haja cada vez menos reclusos a reincidirem. Esta política está a dar resultados: só na Holanda, foram encerradas 19 cadeias na última década. E preparam-se para encerrar mais cinco.
Em Portugal, continua a prender-se demasiadas pessoas e durante demasiado tempo. A ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, admitiu na semana passada que o país tem um "problema grave" em relação à taxa de detenção, que é elevada, e ao tempo médio de encarceramento, que é o maior da Europa. Chamada ao Parlamento pelo PSD no contexto da recente divulgação do relatório do Conselho da Europa sobre Prevenção da tortura e dos maus-tratos - que coloca Portugal entre os 12 países com maior sobrelotação das cadeias - Francisca Van Dunem garantiu, no entanto, que o país já está a inverter a tendência.
"Em dezembro tínhamos no sistema menos 767 reclusos. Se no ano de 2017 foram aplicadas 130 penas de permanência na habitação, e estiveram em execução cerca de 70 penas, entre 21 de novembro e 20 de março de 2018 foram já aplicadas 211 penas de permanência na habitação - o que significa que estamos a fazer um caminho sustentado de alternativa às penas de prisão", afirmou a ministra aos deputados.
Assim sendo, saúde-se o que está a ser feito para diminuir a população prisional. Mas perceba-se também que há ainda muito a fazer para promover a efetiva reintegração dos reclusos e evitar a sua reincidência. O tempo de reclusão tem de deixar de ser apenas um castigo pelo crime - é imperioso que funcione também como uma oportunidade para que os que são detidos renasçam para uma vida nova.
Uma Feliz Páscoa!
PADRE