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A relação de Portugal com os fundos europeus nunca foi boa, mas tende a piorar. A demonstrá-lo estão as metas de execução do PRR, cujos valores foram conhecidos recentemente e só podem deixar qualquer cidadão em estado de profunda apreensão. Os sinais de alarme nem estão tanto nos projetos já concluídos, uma vez que não seria de esperar muito mais do que os 5% apresentados, a dois anos e meio do final do programa. Estão, sobretudo, nas medidas e investimentos em estado “preocupante” ou “crítico”, que cresceram de 26 para 39%, desde a avaliação anterior.
Estes números são de tal forma inquietantes, que parece estar consumada a sentença de morte de alguns projetos emblemáticos, como a barragem do Pisão, o alargamento do Metro de Lisboa ou a expansão da rede de cuidados continuados. Outra das bandeiras do plano que parece comprometida é a construção das 26 mil casas para famílias em carência habitacional, como recordaram os autarcas da A.M. Porto, agastados com a complexidade burocrática dos processos.
A estes pontos, soma-se o falhanço de algumas das agendas mobilizadoras - o verdadeiro pilar de transformação económica do PRR - já assumido por vários consórcios e que justificou uma flexibilização de prazos por parte do novo Governo. Ainda assim, mantendo a baliza temporal de 2026 como algo intransponível.
A realidade é que esta inércia na aplicação da “bazuca” europeia não oferece grande surpresa. O anterior Executivo fez questão de ser dos mais rápidos a pedir o cheque à UE, mas foi pouco previdente a criar as condições necessárias à sua boa aplicação. À cabeça, procurando capacitar a Administração Pública para corresponder aos exigentes prazos da Comissão Europeia. É por isso que a Comissão Nacional de Acompanhamento pede, agora, uma “verdadeira reavaliação organizacional” nas estruturas de gestão, temendo que, se nada for feito, muito do que estava planeado fique por concluir.
Infelizmente, receio que haja pouca saída para atrasos já tão significativos. Restará a devolução das verbas a Bruxelas ou a sua aplicação em projetos que já possam ter outra maturidade. A sensação que fica, porém, é de que o PRR pode tornar-se mais um flop político e a enésima oportunidade perdida para mudar o país.