A revisão constitucional, que o PSD de Passos Coelho apresenta como "mãe" de todas as reformas, nasceu torta. Sobre o projecto inicial, desastradamente lançado na agenda política, abateu-se uma saraivada de críticas. Como os estilhaços da bernarda (também) atingiram as sondagens, soaram as campainhas na São Caetano. E o partido tratou de corrigiu o tiro.
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Encolher as unhas não é o mesmo que desistir, muito menos em política. É dar um passo atrás para preparar novo ataque. O PSD mantém intactos os objectivos. Se suavizou o seu projecto e repete à exaustão a disponibilidade para um debate "sem preconceitos", isso significa, tão-só, que adoptou uma estratégia menos agressiva.
Embora tenha abdicado de uma mão mal cheia de propostas respeitantes ao equilíbrio entre órgãos de soberania - como o reforço dos poderes presidenciais e a moção de censura construtiva - não mudou a essência das alterações que defende em relação ao papel do Estado ou no plano laboral.
Bom exemplo é a questão da garantia do emprego. Na primeira versão, o PSD substituía a proibição de despedimentos "sem justa causa" por "razão atendível". Agora, acrescentou a palavra "legalmente". Basta ouvir o insuspeito Bagão Félix para perceber o que (não) mudou. "Não há razões atendíveis que não sejam legais", observou o ex-ministro do Trabalho de um Governo PSD/CDS. Isto é: o que Passos Coelho quer é transferir da sede constitucional para a lei ordinária as ditas "razões atendíveis", desta forma mais permeáveis a mudanças legislativas consumadas por maiorias conjunturais.
O segundo round da ofensiva social-democrata parece ter começado com o pé esquerdo. Que o PS desferisse um forte ataque ao projecto era mais do que previsível. O que o PSD não esperava era que o presidente da República lhe tirasse o tapete. Mudar, só para melhor, recomendou simplesmente Cavaco Silva, com a sua habitual propensão para emitir mensagens não endereçadas, mas que toda a gente sabe a quem se dirigem.
O processo de revisão constitucional desencadeado pelo PSD nasceu torto. Pelo andar da carruagem, corre o risco de nunca mais se endireitar.