A Associação Nacional de Municípios assumiu por estes dias uma insistência corajosa, de tal modo é impopular defender regalias para titulares de cargos públicos.
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No caderno reivindicativo apresentado ao Governo inclui-se o fim do corte de 5% nos salários que vigora desde 2010, quando o país entrou em resgate financeiro. André Ventura, que percebe de demagogia e sabe ser bem mais aplaudido o inverso, já anunciou que irá propor um corte de 12% nos vencimentos dos políticos, no âmbito da discussão do Orçamento do Estado.
A atual conjuntura e as dificuldades vividas pelas famílias são argumentos invocados pela ministra Ana Abrunhosa para justificar a recusa em reverter uma das raras medidas de austeridade que se mantêm até hoje. Claro que o efeito é meramente simbólico e político, até porque no caso dos autarcas as verbas saem dos orçamentos municipais. E é precisamente esse efeito simbólico que importa discutir: por muito divertido (e tantas vezes justificado) que seja bater nos políticos, este é um tema sério e que merece ser avaliado para além dos chavões e das generalizações abusivas.
Olhando em concreto para os autarcas, cujos vencimentos são variáveis em função do número de eleitores, estamos longe de poder dizer que beneficiam de valores chorudos. Manter há mais de uma década um corte que deveria ser transitório introduz uma situação de injustiça e contribui para uma visão perigosa da política. Lançar a desconfiança sobre os titulares de cargos públicos ou considerar que devem a todo o momento ser castigados é desqualificar uma missão que deveria ser nobre.
O caminho é precisamente o inverso. Faz sentido compensar devidamente os nossos autarcas e ministros pelas responsabilidades que assumem. E, em contrapartida, usar de toda a exigência na fiscalização (impedindo e punindo incompatibilidades e portas giratórias, corrupção, abuso de poder e outros crimes) e nos critérios éticos que ambicionamos ver em quem nos governa. Devemos querer os melhores na política, tendo como objetivo final uma política melhor.
*Diretora