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Versão 1:
O menino Luís amuou. Andava a fazer batota no jogo e foi apanhado. Disse que não queria mais brincar, acusou os colegas de não saberem jogar e atirou o tabuleiro e as peças todas ao chão, num grande estrondo. A professora interveio, pediu que ele confessasse o erro e pedisse desculpa, mas ele recusou dar explicações e escolheu continuar a birra. Disse, furioso, que não está para prestar contas aos outros, que não vale a pena confessar a batota no jogo, porque haverá sempre mais perguntas e porque os adultos nunca estão satisfeitos.
Recusando-se terminantemente a apanhar as peças do chão, manteve a cara fechada e apontou o dedo aos colegas, dizendo que foi uma batota sem gravidade e que há quem faça muito pior. Feio é contar à professora! Ele pode ter atirado o jogo ao chão, mas a culpa é dos queixinhas que o enfureceram, exagerando coisas sem importância!
Pois com certeza. O menino Luís amuou e agora temos todos de ouvi-lo gritar bem alto, que prefere nunca mais voltar à escola do que passar por aquela inquirição. Temos de vê-lo espernear e bater com os pés no chão, enquanto repete mais uma vez que a culpa, da batota, do jogo desfeito e da birra monumental, é dos colegas que não sabem brincar ao faz-de-conta-que-não-aconteceu.
Versão 2:
Luís quer pôr fim à relação. Foi apanhado numa situação suspeita, mas recusa-se a contar à namorada o que aconteceu. Perante as evidências (mensagens, fotos e boatos de traição) responde com evasivas, ou mesmo com acusações. Como ousa ela desconfiar da sua fidelidade? É óbvio que isso é truque de alguma invejosa que os quer separar! É verdade que ele tinha um casamento antigo, mas só no papel, a relação estava acabada e não se falam há meses. Porque é que haveria de ter contado tal coisa?
Desde que estão juntos, ele tem sido irrepreensível. Não há mal nenhum em ter um passado, e não se trata de uma vida dupla. É mesmo só um papel, sem nenhuma importância. Essas evidências são fumo que não indica fogo! Além de que, se ela está assim tão desconfiada, é porque não confia suficientemente nele e, nessas condições, a relação não pode continuar. É melhor terminar tudo! A confiança é essencial e, segundo ele, deve ser cega. Quando é posta em causa, não será por culpa de quem deu razões para tal, é por fraqueza de quem cede aos boatos e à desconfiança. A namorada exige que façam terapia de casal, mas Luís prefere acabar a relação, a ter de expor os seus assuntos íntimos perante alguém desconhecido, mesmo que a terapia fosse o sítio apropriado para esclarecerem as coisas devidamente e tentar evitar a separação. Prefere manter o gaslighting, deixando a namorada sozinha e a sentir-se culpada.