A pergunta é para ti, Sigmar Gabriel. Lideras o SPD, uma das forças mais importantes do Partido dos Socialistas Europeus. És vice-chanceler da Alemanha, em resultado de um acordo imperativo, laboriosamente negociado com Angela Merkel. Como ministro da Economia, acabas de anunciar aos compatriotas a revisão em baixa das perspetivas de crescimento. Não ignoras que a Zona Euro corre o risco da terceira recessão em seis anos e é apontada por todos como o ponto negro da economia mundial. Sabes que, em comparação, os países que não abdicaram de usar as políticas monetária e orçamental para forçar o crescimento, como os Estados Unidos e o Reino Unido, se têm saído bem melhor. Não há nada a concluir?
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Quem te fala não é nenhum fanático das respostas convencionais. Pelo contrário: apreciei o esforço da coligação SPD-Verdes, sob a liderança de Schroeder, para preparar a Alemanha, mais depressa do que os concorrentes, para os desafios da economia global. Admiro o pragmatismo, e também o respeito pelas pessoas, que vos leva a encontrar sempre soluções estáveis de governação, consoante os casos e resultados. E prezo a cultura do compromisso sociopolítico que subjaz a tal atitude.
Também não venho pedir que descures o relacionamento com o teu eleitorado, ignorando as suas aspirações e receios, por solidariedade com outros partidos da tua família política. Desde 1914 que a esquerda democrática sabe que a geografia sobreleva a ideologia nos momentos mais críticos. Tens de evitar o erro que o SPD cometeu na anterior "grande coligação" e louvo a inteligência política com que agora capitalizaste a aprovação do salário mínimo nacional e forças mudanças em vários domínios, da energia à participação das mulheres no mundo da gestão.
A minha questão é outra, e nela podem e devem convergir o interesse alemão e o interesse europeu. Por todas as razões - económicas, de segurança, políticas e culturais, e alinho-as por ordem crescente de importância - à Alemanha interessa que a Europa saia da letargia e que a Zona Euro não regresse à turbulência. Ora, isso não é possível com a interpretação fanática das regras de consolidação orçamental, num jogo em que só a Alemanha vence, e apenas a curto prazo. Isso não é possível se a França ou a Itália forem arrogantemente destratadas, ou as periferias abandonadas à sua sorte.
Por sua vez, à Europa interessa que a Alemanha cresça. Interessa que aumente o seu investimento e melhore o seu nível de vida; interessa, sobretudo, que enfrente as suas fragilidades estruturais, que também as tem e são cada vez mais visíveis, e a desigualdade profunda entre os que estão dentro e os que estão fora dos setores protegidos do mercado de trabalho. Essa desigualdade fere a grande e nobre tradição germânica da coesão social.
Não te maço com pormenores. Mutualização parcial da dívida, "project bonds", redução de juros e alongamento de prazos para os maiores devedores, intervenção mais ativa do BCE no controlo da especulação financeira, injeção de liquidez na economia, investimentos nacionais e europeus em grandes projetos de redes, subida de escala do orçamento comunitário - são tantas as maneiras de atacar o problema que há de ser certamente possível construir uma solução razoável, exequível e em que convirjam os diversos interesses. E, sim, com obrigação de reformar - mas no que importa, como o Fisco, a regulação e a tecnologia, e não apenas para enfraquecer o trabalho e desproteger os vulneráveis.
Não podemos é continuar como estamos, Gabriel. Tudo parado às ordens do teu colega das Finanças, com a notável e valiosa exceção de Draghi, e vocês a perderem vapor a olhos vistos, e o euro a caminhar para uma nova crise.
Mudar depende muito de ti. Um político ambicioso não se conforma com a possibilidade de estar num governo para nada. Conto com a tua ambição.