Esta devia ser uma pergunta sagrada! Afinal, que mapa queremos para o nosso país? Que mapa mental? Como nos vemos e como nos vendemos? Que mapa social? Como nos educamos, nos relacionamos, nos fixamos? Que mapa geográfico? A porta de saída da Europa? Da entrada de África? Ou a porta giratória para todos os continentes? Virada para o Atlântico ou para o Mediterrâneo? E por aí afora, perceber como nos representamos nessa superfície plana que é o mapa mundi onde nos agarramos ao nosso lugar quase a ficar fora do mapa.
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Veio-me isto ao pensamento ao ouvir as notícias sobre a reforma dos tribunais e ao ler, com mais atenção, o relatório sobre a priorização das infraestruturas de elevado valor acrescentado.
O Governo, através da Secretaria de Estado dos Transportes, constituiu um grupo de trabalho que juntando inúmeras entidades públicas e privadas refletiu sobre as necessidades infraestruturais do país ao nível das ligações ferroviárias, rodoviárias, marítimo-portuárias e aeroportuárias.
Genericamente pretendeu-se elencar as necessidades e hierarquizar as mais importantes do ponto de vista essencialmente do seu grau de competitividade e eficiência, intermodalidade, enquadramento na política nacional de transportes e nível de financiamento exigido e respetiva sustentabilidade. Tomou-se igualmente em consideração o privilégio das mercadorias sobre os passageiros (é a economia...) e o que já existe sobre o que é novo.
Elencaram-se 30 projetos, 18 marítimo-portuários, oito ferroviários, dois rodoviários, dois aeroportuários - na sua esmagadora maioria entre o Porto e Lisboa com ramificações escassas ao Algarve e a Vilar Formoso.
Como a maioria só pode avançar se alavancada pelo cofinanciamento comunitário (entre 53 e 61% do valor total de cerca de 5000 milhões de euros) imaginamos que este trabalho terá como resultado a cativação dos respetivos fundos para o efeito.
É, portanto, da maior importância e por isso é de louvar a iniciativa. Devemos pensar no que queremos e no que todos achamos mais importante. O Governo andou bem em promover a reflexão e melhor andará se a mesma for colocada em consulta pública (o que ouvi dizer que aconteceria) e se todos os interessados manifestarem a sua opinião e o resultado da auscultação for tomado em consideração.
E é aqui que vem ao caso a história dos mapas. Como nos vemos, afinal? Um país totalmente litoralizado? Que só resolve os problemas das grandes concentrações e ao fazê-lo promove a respetiva saturação? Que funda a sua estratégia apenas nas importações e exportações? Que ignora a importância do território?
É que basta olhar para o mapa dos corredores estratégicos resultantes das escolhas feitas para tombarmos todos sobre a costa.
Como seria se a nossa matriz multicritérios em vez de privilegiar mercadorias, pensasse na mobilidade das pessoas no interior e do interior para o litoral, avaliasse as modernizações já feitas em vez de avançar com mais fases de eternas requalificações, escolhesse gastar menos em muitos pequenos fechos em vez de enormidades em canais que por serem únicos serão sempre insuficientes, fizesse preceder os investimentos da implementação de mais eficientes custos de manutenção e operação, preterisse o escoamento dos turistas de massa em favor da capilaridade necessária a um turismo policêntrico e de nicho, pensasse, enfim, no território como um todo rico e complementar.
Nada disto parece merecer a etiqueta de "elevado valor acrescentado", pois não? Mas talvez não seja apenas a teimosia de uma análise feita sempre com os pés no chão. Num chão com nome e pessoas, história e futuro. Talvez seja apenas a falta que faz no mapa que nos apresentaram a evidência da fatura de um país muito pouco eficiente porque limitado na valorização dos seus recursos, pouco corajoso na inversão radical de expectativas e de estratégias e até um pouco míope se acreditar que progredir para uma economia de baixo carbono é insistir num modelo de povoamento concentrado e numa oferta que apesar de ser sobre carris não deixa de ser de betão.