Di-lo o "Financial Times". Di-lo a "Economist". Dizem-no americanos e muitos europeus. Se os países em melhor situação financeira não adoptarem uma política mais expansionista, se o Banco Central Europeu continuar obcecado com a inflação, se a União Europeia continuar a chegar ao todo através da soma das partes, se, se, se... a actual crise da economia europeia tem uma elevada probabilidade de ganhar uma dimensão política cujos contornos são difíceis de prever.
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Quanto mais é dito e redito, mais os líderes e instituições europeus parecem bloqueados nas suas decisões. Realisticamente, o melhor é nada esperar daquele lado e fazermo-nos ao caminho. Se não atrapalharem, já não será mau.
Condições externas à parte, o nosso maior entrave decorre de um Estado pesado e, aparentemente, generoso, que ajudou a alimentar os equívocos sobre a sustentabilidade de um modo de vida centrado na facilidade e no imediatismo consumista. É preciso emagrecê-lo, focá-lo, torná-lo menos "mãos largas". Nada disto é novo, como não é novo o atalho seguido: aumentar os impostos. Noutras ocasiões foi pretexto para pouco ou nada mudar. Agora, não poderá ser assim. Não nos deixam. Mas, para já, não obstante os anúncios de cortes no Estado e nas suas despesas, continua a ser assim e nem sempre bem. Parece haver intocáveis. Os argumentos do primeiro-ministro para a não taxação da riqueza não fazem sentido. É certo que nós precisamos de quem invista e de atrair capital estrangeiro. Só que, para isso, são precisos incentivos adequados, medidas concretas, quantas das vezes negociadas caso a caso, que nada têm a ver com as propostas em apreço.
Neste processo de ajustamento, é grave que, mais uma vez, toda a iniciativa seja do Governo. Salvo raras excepções, os interesses instalados, desde os que estão entrincheirados no aparelho de Estado, até aos que vivem de negócios com o dito, passando pelos empresários e sindicatos, limitam-se a reagir, colocam-se na defensiva, como se a situação actual, afinal, lhes servisse bem. Fazem falta propostas, desde as mais equilibradas e generosas, capazes de concitar consensos, até às mais radicais, capazes de gerar discussão.
Gostaria de ter visto os mais ricos, em vez de reagirem, proporem, se não uma tributação da riqueza, uma forma de estimular a sua criação e a sua disseminação e comprometerem-se com ela.
Gostaria de ter visto as Forças Armadas liderarem a discussão estratégica sobre o seu papel num país pequeno e periférico, não ignorando as nossas especificidades. Enquanto cidadão interrogo-me sobre o seu peso no orçamento e sobre a importância relativa de exército, marinha e força aérea nos dias que correm, não fazendo tábua rasa dos compromissos internacionais assumidos, mas não ignorando que as restrições acrescidas nos obrigam a estabelecer prioridades. E quanto mais penso, mais me parece que estas são questões a que, por definição, quem está preparado para fazer a guerra deve ser capaz de responder em tempos de paz.
Como gostaria de ter visto as gerações mais novas, em vez de reivindicarem a perpetuação de um modelo, centrado no Estado, que até os mais velhos já perceberam que faliu, questionarem abertamente aquilo de que falam em surdina. Por exemplo, a falência do sistema de pensões. Quem hoje tenha menos de quarenta anos dir-lhe-á não acreditar que virá a ter uma pensão de reforma, por mais exercícios de sustentabilidade com que lhe acenem. Descontam para a geração dos seus pais (sim, é para eles que descontam e não, ao contrário do que muitos pensam, para si próprios) que vêem trabalhar até cada vez mais tarde. Apetece-lhes perguntar como foi possível haver reformados com pouco mais do que a sua idade, se são justas pensões tão elevadas como algumas de que ouvem falar. Não seria possível cortá-las? Talvez, assim, pudessem pagar um pouco menos de impostos ou fazer menos descontos. Com medo do politicamente correcto, nada dizem. Mas vão pensando, sentindo-se menos solidários, prenunciando o princípio do fim deste sistema.