Entre pandemia, guerra, inflação e doenças emergentes, os últimos tempos têm-nos proporcionado acontecimentos pouco motivadores de esperança e que ameaçam mergulhar-nos numa espécie de depressão coletiva. Ainda assim, nada apaga a evidência de que há más notícias que não podem ser ignoradas mas antes, ao contrário do que está a acontecer, mais contextualizadas e explicadas.
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É o caso da mortalidade excessiva que se verifica de forma constante no nosso país desde início da pandemia. Seria lógico considerar que a covid explica as estatísticas, mas sucessivos relatórios e dados de diferentes entidades vêm reforçar a conclusão inversa. O vírus SARS-CoV-2 está longe de justificar boa parte dos números e a autoridade de saúde admite não haver, por agora, leituras do que está a acontecer.
Comecemos por 2020, primeiro ano da pandemia e do qual há já relatórios consolidados. Houve seis períodos de excesso de mortalidade, mas a covid só explica dois deles. A mortalidade em geral foi atipicamente elevada, o que de resto continua a acontecer na atualidade. Em maio, registaram-se valores para aquele mês sem paralelo nos últimos 40 anos. A esperança média de vida recuou 4,1 meses, de acordo com os dados do INE divulgados esta semana.
Se os efeitos do novo coronavírus são óbvios e continuam a fazer-se sentir nos relatórios semanais, ainda que socialmente estejamos a normalizar e a aprender a viver sem a angústia diária dos dados de infeções e internamentos, mais complexo será problematizar o que acontece noutras patologias. E é imperativo que sejam investigadas as causas do excesso de mortalidade.
Poderemos vir a descobrir que eventualmente o Serviço Nacional de Saúde não reagiu tão bem à pandemia como anunciado pelo Governo, ao descurar patologias não covid. Ou que o medo e eventuais excessos no "fique em casa" afastaram quem precisava dos hospitais. Sejam quais forem as conclusões, sabermos o que se passa é um direito. Estamos literalmente a falar da vida e da morte dos portugueses.
Diretora do JN