Corpo do artigo
Com três séculos de Inquisição, doze anos de ditadura Miguelista, setenta de liberalismo falhado, dezassete de República perdida e cinquenta de Ditadura, temos de ser justos: é um milagre que continuemos a ser um país. E por isso temos de perder o hábito de nos apoucarmos perante a estranja que, em muitos aspectos, não é mais do que nós. Mas esta subserviência é pecha antiga. Já em 1868, Júlio Dinis se insurgia contra ela: "A causa disto é sermos uma nação pequena e pouco à moda, acanhada e bisonha, nesta grande e luzidia sociedade europeia, onde por obséquio, somos admitidos, dando-nos já por muito lisonjeados, quando os estrangeiros se deixam benevolamente admirar por nós".
Incisivamente acrescenta: "Nós temos o defeito daqueles provincianos que, nos círculos da capital, enfocam envergonhados, como coisa de mau gosto, uns restos de amor da terra que ainda os punge, e deitam-se a exaltar, com afectação altamente cómica, os prazeres e comoções da vida das grandes cidades que ainda mal gozaram e ainda mal saboreiam". Mais: "Ainda também os portugueses, acanhados nos círculos da europa, não ousam conferir diplomas de excelência a coisa que lhes pertença; envergonham-se de falar nas riquezas pátrias enquanto abrem a boca, por convenção, a tanta insignificância que, em todos os géneros, a vaidade estrangeira apregoa como primores (…)".
E conclui: "No fim de tudo ficam mais ridiculamente provincianos". Embora muitas coisas lá por fora (e na capital) nem sejam dignas de registo, acho que temos de puxar por alguns galões e dizermos quem somos e o que queremos. E que todos o ouçam.
* Professor e escritor
O AUTOR ESCREVE SEGUNDO A ANTIGA ORTOGTAFIA