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Já escrevi sobre o material escolar psicadélico, sobre os livros confusos e pesados. Igual perplexidade me mereceria uma análise cuidada à profusão de reformas e contrarreformas dos nossos planos curriculares pré-universitários.
Até que li o discurso de Frederico Lourenço, o nosso novíssimo Prémio Pessoa, e percebi porque é que me assalta sempre um sentimento de modismo e de superficialidade quando ouço falar destes temas.
A clareza com que defende a reintrodução do Latim e do Grego no Ensino Secundário e a evidência arrasadora como demonstra que sem o seu estudo não temos condições de nos percebermos, nem de perceber grande parte do nosso espaço vital europeu, é tão magnífica como a qualidade da obra de tradução que empreendeu e que marcará o nosso universo literário para sempre.
Permito-me citar: "A ideia da pretensa inutilidade das línguas clássicas é um enorme equívoco, que toda a minha vida profissional me tenho esforçado por combater. Sobre o caráter imprescindível do latim, num país com a história do nosso, penso que nem deveria ser necessário insistir. Até ao século XVIII, quase metade dos livros publicados em Portugal eram em latim. Como é que iremos estudar, no século XXI, a história do nosso país se aceitarmos passivamente a ideia de que as línguas clássicas são inúteis? Como é que vamos estudar a epigrafia romana do nosso território? Ou os manuscritos medievais e renascentistas em latim que abundam nas nossas bibliotecas, começando logo pelos da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra? Como é que vamos ler no futuro os acervos extraordinários dos mosteiros que foram extintos no século XIX, como Alcobaça e outros"?
E ainda: "Quando vemos que noutros países europeus os alunos do Ensino Secundário, que para tal mostrem apetência, têm a possibilidade de fazer cinco ou mais anos de latim e grego antes de chegarem à universidade, bem lamentamos a situação dos nossos alunos portugueses, que estão condenados a iniciar o latim e o grego na universidade em licenciaturas que duram apenas três anos. É preciso que tomemos consciência urgente deste facto: os três anos de licenciatura não são suficientes para estabelecer as bases de línguas como o latim e o grego: é preciso começar mais cedo, antes da universidade. É preciso começar no Ensino Secundário. Enquanto isso não voltar a acontecer, a qualidade das nossas Humanidades e o estudo da história e cultura portuguesas estarão no futuro seriamente comprometidos ".
Alguém duvida? E quem terá coragem?
*ANALISTA FINANCEIRA