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É o que faz um gato assanhado. E foi título de um curioso jornal satírico da Madeira que durante 48 anos e em ambiente de apertada censura chamou a atenção para tantas e tantas situações, ora ridículas ora penosas e que só assim poderiam expor-se e motivar alguma reação. Faço já um parêntese e sugiro a todos que passem pela Região Autónoma da Madeira a visita ao novíssimo Museu da Imprensa, em Câmara de Lobos, que com a riqueza que só os domínios insulares conseguem alberga uma extraordinária memória do saber fazer da impressão tipográfica e, sobretudo, a recolha dos muitos e muitos títulos que existiram nesta comunidade. Fantásticos, quase todos no nome (do Re-nhau-nhau ao Patriota Funchalense passando pelo Beija-Flôr) mas todos seriamente empenhados na discussão coletiva de um destino que só há pouco, há 40 anos, lhes pertence realmente.
Mas é mesmo o gato assanhado que me interessa. A onomatopeia pode bem representar o posicionamento que Portugal devia assumir na atualíssima constituição do colégio europeu.
AComissão é ainda, por definição, o núcleo mais importante da intrincada governação europeia. O seu poder executivo e de acompanhamento permite-lhe obter uma intervenção eficaz e um conhecimento real do funcionamento dos estados-membros e dos resultados das políticas. O contributo em feedback por via desta posição entre a Europa dos 27 e cada um dos estados-membros, é relevantíssimo para o acréscimo de prestações quer do Conselho quer do Parlamento.
Faz, portanto, bem o Governo português em ponderar com cuidado e chamar ao processo o maior partido da Oposição.
E faz igualmente bem, mesmo surpreendentemente bem, começar por discutir a pasta e só depois o nome.
Para que tipo de intervenção devemos focar as nossas energias? Só depois, obviamente, poderemos ponderar quem estará em melhores condições de a desempenhar.
Dito isto haveria que ter alguma ousadia. Se estudarmos com alguma calma a lista de comissários e respetivos pelouros da última Comissão Barroso verificaremos que o desafio é garantir a representatividade de todos os países, desmultiplicando quase até ao ridículo as matérias à guarda de cada um.
São as relações exteriores que não são assumidas em conjunto e que mesmo assim são estranhas aos assuntos do alargamento e da política de vizinhança, a energia que está separada do ambiente, a concorrência que não se inclui nos assuntos económicos que por sua vez se distingue do mercado interno e dos serviços e ainda da indústria e do empreendedorismo, ou o misterioso pelouro do desenvolvimento que diz respeito a todos e nada pode fazer sozinho. Digo eu!
Se a política de alargamento continuar e a filosofia se mantiver, ainda teremos um concurso de ideias para encontrarmos temas ou títulos para todos os comissários. E era aqui que o Re-nhau-nhau da Madeira faria seguramente um excelente número satírico.
Portanto, onde Portugal poderia dar um contributo interessante seria precisamente na revisão desta fórmula e na consensualização de uma abordagem, que terá de se impor, e que progressivamente separará o Governo executivo da representatividade e na identificação de uma orgânica que, de facto, se dirija aos principais problemas comuns da União.
Epara este trabalho futuro fica já a minha opinião: Portugal deveria bater-se pelo pelouro do "aprofundamento da integração". Não sendo um dos grandes países da União e porventura aproveitando a pouca atenção dada a um tema que parece impossível, Portugal teria enorme vantagem e enorme poder de influência, assim o percurso se fizesse numa combinatória acertada de política e trabalho técnico.
Se não nos assanharmos, como o gato, então resta esperar para ver qual a novidade politicamente correta que Junker é obrigado a trazer (como o pelouro do Clima da 1.ª para a 2.ª Comissão Barroso) e tentar escolher com algum grau de liberdade. Ou seja, não presos a obrigações vãs como a de estarmos obrigados a escolher uma mulher e, por exclusão de partes, irmos descartando uma ou outra das que historicamente nos têm representado em Bruxelas. Com o máximo respeito por todas e suspeitando que partilham desta opinião.