A atual depressão/recessão do país representa a fatura constituída por erros de vária natureza, neles incluída a ilusão de um falso novo-riquismo. Durante anos o crédito fácil alimentou o consumismo desenfreado e permitiu todo o tipo de disparates. A chamada política do betão foi, desse ponto de vista, o expoente máximo do desbaratar de recursos - e não apenas pelo exagero mais mediático da construção de autoestradas segundo modelo ruinoso (PPP) e para as quais não há utilizadores em número razoável.
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Sem ninguém ousar colocar-lhe travão, a megalomania fez a sua escola. E deixou sequelas.
O drama por que passa o setor da construção civil é exemplificativo. Consequência da inexorável retração do investimento em obras públicas, mas também da recessão no mercado do imobiliário, colecionam-se falências e milhares e milhares de trabalhadores engrossam preocupante taxa de desemprego. E o Estado, pela via da Administração Central ou das autarquias, não só não amortece a crise na construção civil como ainda a acentua ao ser responsável por um gigantesco calote: mais de 1,55 mil milhões de euros!
O definhamento da construção civil é, pois, dos mais ilustrativos da acumulação de disparates. Nas últimas décadas, a par de uma rede viária excessiva, alimentou-se a especulação imobiliária, a mania do novinho em folha; em simultâneo matou-se o mercado de arrendamento e os parâmetros mínimos exigíveis da qualidade das habitações existentes. O resultado aí está, catastrófico: o parque habitacional português degradado atinge os 34% - fazendo recordar os escombros de uma grande guerra! Calcula-se em dois milhões o número de fogos em ruínas ou neles vivendo em condições infra-humanas.
Embora o crédito seja cada vez mas rarefeito, está na cara ser a construção civil um dos setores através dos quais é possível minimizar os constrangimentos provocados pela recessão. Como? Incentivando a política de reabilitação urbana - impondo-a mesmo, em certos casos, apesar dos cuidados a ter para não atropelar o direito à propriedade privada.
A reabilitação é, na verdade, indiscutível linha-mestra através da qual podem esbater-se problemas e pôr fim à imagem degradante de cidades, vilas e aldeias de Portugal. A recente aprovação de uma nova Lei do Arrendamento será um primeiro passo, mas demasiado imberbe por estarem os senhorios tão falidos quanto os inquilinos. A alocação e aproveitamento de fundos comunitários são essenciais e, desse ponto de vista, pouco ou nada se tem feito.
A reabilitação urbana em Portugal é residual - ronda os 6,5%, contra os 36,8% da Europa. Nunca como agora se justificou tanto encurtar distâncias.