Reforma laboral: produtividade com pessoas no centro
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Portugal discute mais uma reforma laboral. O Governo apresenta-a como condição para a competitividade, os sindicatos denunciam-na como um retrocesso de direitos. No meio da disputa, corre-se o risco de esquecer o essencial: uma reforma laboral só faz sentido se aumentar a produtividade, se permitir pagar melhores salários e se garantir qualidade de vida a quem trabalha. Tudo o resto é ruído.
O trabalho mudou profundamente. Compete-se por talento, por tempo e até por atenção; há inteligência artificial, cadeias globais e empresas que nascem pequenas, mas querem escalar depressa. Regras pensadas para a rigidez industrial do século passado já não servem. As empresas precisam de flexibilidade, mas flexibilidade não pode ser sinónimo de precariedade. Os trabalhadores precisam de proteção, mas proteção não pode asfixiar a criação de riqueza. O desafio é encontrar equilíbrio inteligente.
Para que isso aconteça, é preciso que a lei tenha propósito e métricas claras. O objetivo deve ser simples: mais produtividade por hora trabalhada, progressão salarial real ligada ao desempenho e às competências, e previsibilidade tanto para quem trabalha como para quem investe. Sem isso, qualquer reforma será apenas mais um remendo.
O caminho passa por apostar na qualificação, garantindo que cada trabalhador tem acesso efetivo a formação contínua que se reflita em progressão salarial. Passa também por incentivar as empresas a pagar melhor, criando mecanismos fiscais que premiem quem aumenta salários acima da média do setor ou da inflação, e por valorizar as que ligam progressões a ganhos de produtividade. É igualmente decisivo aliviar a carga fiscal sobre o trabalho, reforçando o rendimento líquido das famílias sem agravar custos para as empresas. A simplificação administrativa é outro pilar incontornável: contratos, horários e obrigações devem estar concentrados num sistema digital único, evitando a burocracia que penaliza sobretudo as PME. E não menos importante, é preciso justiça laboral célere e previsível, porque segurança jurídica também é salário futuro.
Há exemplos internacionais que provam que este caminho é possível. A Alemanha e a Áustria, por exemplo, incentivam fiscalmente empresas que distribuem participação nos lucros ou investem na formação dos seus trabalhadores, criando ciclos virtuosos de produtividade e progressão salarial. Os países nórdicos conseguiram, através da negociação setorial e da aposta em competências, manter salários elevados sem perder competitividade. Portugal não precisa de copiar modelos, mas deve ter a coragem de aprender com quem já conseguiu ligar flexibilidade, proteção e crescimento.
Reformar é, sobretudo, mudar a cultura: empresas que partilham resultados com os trabalhadores conseguem reter talento e inovar; trabalhadores que veem o seu esforço recompensado investem, consomem e ficam. A lei deve ajudar a criar este círculo virtuoso. Uma reforma laboral que se limite a regular horas ou despedimentos não resolverá nada. O que Portugal precisa é de um pacto para produzir melhor e pagar melhor, com regras simples, incentivos claros e respeito mútuo. Só assim deixaremos a agenda do conflito para abraçar, finalmente, a agenda do futuro.