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Todos os anos, a PGR publica o relatório síntese do MP relativo, nomeadamente, aos quadros de magistrados, organização e competência, apoio técnico e serviços digitais. Foi agora divulgado o atinente a 2024, remetido a diversas instituições do Estado e órgãos de soberania. Mais do que uma mostra da intervenção do MP nas várias áreas do direito, o documento deveria servir de análise e reflexão e apresentar conclusões que permitissem satisfazer as reivindicações mais que legítimas e justas dos magistrados, que se vêem cada vez mais assoberbados, mais castigados pelo acréscimo de trabalho. Por demasiado extenso, limitar-me-ei a uma abordagem perfunctória das funções do MP na 1.ª instância. Comecemos pelo quadro de magistrados. Em 2023 era de 1557, em 2024, 1533. Não espanta esta redução, a profissão deixou de ser atractiva, os candidatos ao CEJ diminuíram drasticamente, muitos dos concorrentes têm pouca cultura geral e específica, não possuem conhecimentos bastantes para virem a desempenhar uma função de tanta exigência e rigor. Para além de que, segundo as notícias, muitos reprovam nos testes psicotécnicos. A pressão para que os magistrados trabalhem fora de horas, sábados, domingos e férias são muitas e os vencimentos não são actualizados há anos. O Governo considera o valor da renda de 2300€ moderada e aqueles recebem de subsídio de habitação 850€. São obrigados a preencher as vagas nos tribunais mais distantes, desde o Norte ao Sul do país e regiões autónomas. Exercem funções em todas as comarcas e departamentos de Portugal e nas diversas e múltiplas áreas do direito, incluindo o atendimento aos cidadãos. Todo este extenso agregado de intervenções pressupõem um trabalho profundo e rigoroso de análise, investigação e recolha de meios de prova essenciais à prossecução da justiça. O citado relatório diz-nos que, durante o ano de 2024, só na área criminal foram instaurados cerca de 650 mil inquéritos, verificando-se um aumento de mais de 33% relativamente ao ano anterior. Foram deduzidas mais de 55 mil acusações, arquivados cerca de 340 mil, e aplicado o instituto da suspensão provisória em mais de 13 mil processos. Não menos essencial à realização do Estado de direito social é a intervenção nas restantes áreas, como laboral, cível, administrativa e fiscal e no tribunal do comércio, nos quais milhares de acções são interpostas pelo MP e outras tantas por ele contestadas. Mereceriam especial referência os tribunais de família, a que se voltará noutra oportunidade. Esta síntese da síntese quer trazer a lume a complexidade de trabalho diário, mensal, anual do MP, a maioria das vezes prestado em condições muito deficientes, sem os meios técnicos e tecnológicos actualizados e uma falta sistémica de funcionários judiciais. O MP esforça-se, está em ruptura física e psicológica, mas a indiferença e até a crítica fácil e demagógica mantêm esta magistratura, aliás como a judicial, sob uma tensão insustentável.
A autora escreve segundo a antiga ortografia