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O pacote de medidas para a habitação aprovado em Conselho de Ministros aponta, em termos gerais, na direção certa. A redução do IVA para 6% na construção de habitação até determinado valor, a penalização fiscal aplicada a não-residentes que alimentam a especulação imobiliária e a isenção do adicional ao IMI para imóveis destinados ao arrendamento são passos importantes para recentrar o setor nas necessidades dos portugueses. Junta-se a estas medidas a majoração das deduções em sede de IRS com despesas de habitação e a forte descida da tributação para senhorios, o que pode ajudar a dinamizar a oferta.
Há, contudo, um ponto que fragiliza a coerência política e económica do pacote: a definição de "renda moderada" em 2300 euros. Esta fasquia é incompreensível no contexto português. Num país onde a renda mediana não ultrapassa os 1242 euros em nenhum concelho e em que o rendimento médio bruto ronda os 1600 euros, classificar como "moderadas" rendas quase no dobro do salário médio nacional não faz jus à realidade das famílias. Pior, de acordo com os dados do Fisco, apenas 6% dos agregados familiares tinham rendimentos a este nível. Politicamente, é um erro comunicacional; economicamente, arrisca distorcer o mercado ao permitir mascarar rendas altas de "moderadas", além de desviar receita fiscal que poderia apoiar habitação realmente acessível.
É justo reconhecer o esforço do Governo para enfrentar a crise da habitação. Mas é essencial corrigir opções conceptuais que comprometem a credibilidade da política pública. Tudo está bem, exceto a definição de renda moderada. Fixá-la em 2.300 euros é não compreender a vida real das famílias portuguesas.