A crise inflacionista que estamos a viver é uma oportunidade única para testar de forma massiva e séria o conceito de rendimento básico incondicional (RBI). O Governo poderia avançar com uma experiência limitada no tempo. A desculpa para avançar com a medida é mais do que óbvia: a perda acelerada do poder de compra de grande parte das famílias portuguesas.
Corpo do artigo
Ao contrário do rendimento social de inserção (RSI), o RBI é, como o próprio nome indica, incondicional, isto é, não depende do nível de rendimentos dos beneficiários. De forma limitada, o Governo acabou por fazê-lo ao atribuir 125 euros a cada contribuinte que não aufira mais de 2700 euros brutos por mês.
Trata-se de uma medida dirigida só aos mais pobres? Não, claramente que vai muito para além dos patamares mínimos de subsistência. Em contas por alto, Portugal tem 5,5 milhões de contribuintes, 4,9 milhões dos quais têm um rendimento médio mensal (14 meses) até 2857 euros, valor muito próximo dos 2700 euros brutos estabelecidos como limite para esta ajuda. Como os beneficiários de prestações sociais também vão receber, cerca de 5,8 milhões de portugueses serão contemplados.
A medida tem sido defendida pelo Livre e pelo PAN. É consensual? Não, de todo. Tanto assim que Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu, veio sublinhar que "é essencial que o apoio orçamental para proteger as famílias vulneráveis do impacto de preços mais elevados seja temporário e direcionado", argumentando, adicionalmente, que tal "limita o risco de alimentar as pressões inflacionistas". Em que mundo vive Lagarde? As classes média-baixa e média-média têm sentido, em termos proporcionais ao seu rendimento habitual, uma perda de poder de compra acentuada. "Crise alimentar atinge classe média e imigrantes". Esta foi a manchete do JN no dia 1 de outubro. Quem tem filhos a estudar, quem contraiu créditos à habitação e quem paga rendas altas? A classe média. Tudo sem apoios da Segurança Social.
*Editor-executivo-adjunto