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O presidente da Repúbica puxou ontem dos galões de reputado economista para dizer o seguinte: "Os observadores externos estão errados na análise que estão a fazer da situação portuguesa e eu espero que possam corrigir, que olhem para os indicadores portugueses, que os comparem com os outros países e chegarão, como eu chego, à conclusão de que a sustentabilidade das finanças públicas portuguesas, tal como a sustentabilidade das nossas responsabilidades externas, é bem mais forte que a sustentabilidade de outros países". Cavaco Silva está cheio de razão. Sendo assim, impõe-se a pergunta: por que motivo a Bolsa deu, anteontem, um gigante trambolhão e o risco da dívida pública (o preço que Portugal tem de pagar pelo dinheiro que pede emprestado) disparou?
Na verdade, nenhum dado económico se alterou radicalmente para que tal tivesse acontecido. E não estamos livres, longe disso, de que o cenário se repita nos próximos dias, mantendo-se as circunstâncias económicas inalteradas. A resposta está na política.
Os mercados e as famigeradas agências de rating são muito sensíveis a qualquer declaração mais descuidada de um alto responsável político e/ou à turbulência política que se vive no país sob (apertada) vigilância. Bastou que o Joaquín Almunia, comissário para os assuntos económicos da União Europeia, tropeçasse nas palavras, estabelecendo uma injusta e em certo sentido irresponsável comparação entre Portugal e a Grécia, para provocar um terramoto.
Problema: as palavras do comissário pesam nos nossos bolsos. O efeito dominó causado pelo acesso mais caro ao dinheiro termina num aperto nos orçamentos familiares. É por isso que os actores políticos, lá fora e cá dentro, estão obrigados a usar da máxima responsabilidade quando se pronunciam sobre matérias delicadas como esta, ou quando tomam decisões que apenas ajudam a complicar o que já está muito complicado.
Cabe neste figurino a lamentável discussão (e o lamentável desfecho) sobre a Lei das Finanças Regionais. Tal como Cavaco, também Teixeira dos Santos está cheio de razão e faz muito bem em deitar mão a todos os instrumentos legais que permitam contrariar a loucura. Numa altura em que todos os sacrifícios são poucos, que sentido faz aumentar as verbas a transferir para uma região que tem índices de desenvolvimento perto dos da média europeia? Um observador externo só pode concluir: algo vai mal no reino de Portugal. Dizer hoje uma coisa e fazer amanhã o seu contrário não é propriamente um sinal de coerência. E os mercados abominam a incerteza.
Ontem, no Parlamento, o deputado Guilherme Silva, porta--voz de Alberto João Jardim para o Continente, encheu os pulmões de ar e gritou: "Os portugueses estão solidários com a Madeira". Eu, senhor deputado, não estou. Aposto singelo contra dobrado em como há muitos outros "cubanos" que também não estão.