<p>A Direcção do PSD lançou o repto de se avançar com o processo de revisão constitucional, previsto para a actual legislatura. Foi uma decisão correcta e atempada. Teve de imediato o contraditório de vozes críticas. Pouco acintosas e pouco convictas, mas indiscutivelmente legítimas.</p>
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Contudo, facilmente rebatíveis porque a opção foi correcta e no momento adequado.
As tais críticas, tímidas e silenciosas, afirmavam não ser este o momento indicado para esta iniciativa, que devia ser remetida lá para diante, pós eleições presidenciais de 2011.
Foi também contestado o facto de, face à posição desfavorável do PS, imediatamente tornada pública, o processo estar condenado ao insucesso. É sabido que a conjugação dos dois partidos é indispensável à alteração da Lei Fundamental.
Igualmente ouviu-se um contraditório relativamente aos contornos das modificações a propor, quanto ao seu desfasamento dos problemas reais que hoje afligem os portugueses e quanto à sua imprescindibilidade para o desenvolvimento de algumas das reformas que o PSD defende - ex. as alterações às leis eleitorais.
A legitimidade, e até a boa intenção, destas observações é pouco consistente.
O momento escolhido é o adequado. Depois das presidenciais, infelizmente numa previsível conjuntura de forte tensão social, a caminho de eleições nacionais para escolha de um novo primeiro-ministro, será impossível obter qualquer tipo de entendimento entre PSD e PS. Qualquer revisão consistente sempre se fez e sempre se fará, em circunstâncias que apontem para disputas interpartidárias longínquas. A partir de Janeiro de 2011, PSD e PS só terão olhos e atenções virados para as eleições legislativas de 2013 - partindo do pressuposto optimista de que o agravamento da crise não obrigará a eleições logo a seguir à escolha do novo presidente da República.
A oposição do PS também não é razão para hesitações. O PS hesitou quase 14 anos, até acordar as alterações que em 1990 criaram as condições para privatizar a economia, liberalizar o acesso à propriedade de órgãos de comunicação social e desestatizar a posse da terra no Alentejo. Essas hesitações desqualificaram-no eleitoralmente e conduziram Cavaco Silva a um ciclo de uma década de poder reformista. Vale pois a pena afirmar as diferenças e deixar o PS, caso o deseje, barricado no seu habitual conservadorismo. Pagará por isso a devida factura política.
Finalmente a substância das propostas do PSD. Pensar estruturalmente o Estado não significa autismo em relação à situação do país. Os portugueses sabem que sem reformas estruturais profundas, muitas delas constitucionais, nunca sairemos da situação de pântano em que estamos atolados. A regionalização, nomeadamente a possibilidade de se avançar com uma região piloto e experimental, a introdução do regime "presidencial" na governação autárquica, e mesmo a modificação competitiva de legislação laboral, exigem uma revisão constitucional.
Para além disso, a proposta do PSD ainda não está terminada. Ainda passará pelo crivo democrático do partido, em que outras achegas positivas poderão ser introduzidas. Tenciono nesse momento dar o meu contributo. Tenciono, entre outras medidas, propor o desaparecimento de organismos bizarros e caros, como o que dá pareceres inúteis sobre a liberdade de expressão e funcionamento da comunicação social. Uma lei de imprensa adequada, o autocontrolo das redacções e uma Ordem profissional com fortes poderes de imposição de um verdadeiro código deontológico, será um salto para mais democracia e menos despesa. Medidas com esta darão consistência a um verdadeiro PEC político - Programa de Estabilidade e Crescimento. A diminuição consistente da despesa e o relançamento da economia, baseada num modelo de desenvolvimento alternativo, também têm uma imprescindível vertente constitucional.
Até Janeiro, aconteça o que acontecer, o PSD já ganhou com este passo em frente. Seria bom que o PS quisesse perder menos, e, saindo do seu tradicional imobilismo, construísse com o PSD a maioria necessária à concretização deste desígnio.