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Esta pergunta entra bem no rol daquelas que se diz valerem um milhão de dólares: vai Rui Rio declarar publicamente o seu apoio a Rui Moreira? O candidato à Câmara do Porto deseja muito que esse episódio ocorra: "Obviamente, gostava de ter o apoio de Rui Rio", disse Moreira ao JN (ver edição de 27 de maio). O desejo do candidato apoiado pelo CDS/PP é concretizável?
É concretizável. Mas é provável? Olhemos para os factos.
A narrativa do poder (Paulo Rangel chama-lhe, talvez mais apropriadamente, a "psicologia do poder") com que Rui Rio se fez presidente da Câmara do Porto teve como alicerces, para o bem e para o mal (o balanço há de ser feito a seu tempo), uma espécie de regresso aos bons princípios da política e da governação.
Em certo sentido, Rio usou, em todos os seus mandatos, aquilo a que Adriano Moreira chama o eixo da roda (a roda move-se, imagem do Mundo que caminha; o eixo permanece no mesmo sítio, imagem dos valores que permanecem intactos nesse imparável movimento) para se diferenciar do que estava para trás e para desenhar com rigor o caminho que estava para a frente. Com isso Rui Rio criou a imagem do político que só diz a verdade e nada mais do que a verdade, que não soçobra aos espúrios interesses, que define prioridades e tem o povo no eixo do processo de decisão, que é rigoroso no uso dos dinheiros públicos. Valha a verdade: pode atacar-se a estratégia por vários lados, mas ela projetou Rio no país e deu-lhe vitórias no burgo portuense.
Esta construção, digamos assim, tem um problema: não admite exceções. Não as admite, desde logo, por uma questão de princípio(s): os valores não são moldáveis às circunstâncias. Está aqui o problema desta equação: a retidão que Rio quis usar durante os seus mandatos é a retidão que se lhe exige no fim dos seus mandatos.
Semana sim, semana não, o presidente da Câmara do Porto tem aparecido ao lado de Rui Moreira em múltiplas iniciativas, todas devidamente retratadas e gravadas para uso nos meios de Comunicação Social; o presidente da Câmara do Porto é um acérrimo crítico (para dizer o menos) da candidatura de Luís Filipe Menezes, seu companheiro de partido, à sua sucessão. Em nome da retidão, só uma coisa faz sentido: Rio devia assumir publicamente o seu apoio a Rui Moreira.
É dos livros: os valores essenciais não podem (ou não devem) ceder o passo aos valores instrumentais. Se, em nome de uma carreira política que o pode conduzir à liderança do PSD, ou a outra liderança, Rio não apoiar Moreira por temer alienar o património que hoje tem no partido, estaremos perante uma fraude política de apreciáveis dimensões. Tudo aquilo que Rio tentou construir em 12 anos esboroar-se-á num instante. Será, então, possível continuar a confiar neste homem?