Não deixou de haver Direita democrática, ela foi simplesmente ocupada pelos partidos da Esquerda moderada. A despudorada euforia fascista atirou os partidos à Direita ao extremo, recrudescendo os discursos de ódio, a avidez por defender elites e manter a larga maioria servil, prestável e submissa. Por seu lado, a tragédia da Esquerda no Mundo passa exatamente pelo seu flirt obsceno com o capitalismo elementar, uma espécie de vontade de ter tudo ao mesmo tempo: a defesa dos valores humanos e a progressão para o luxo de apenas alguns.
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Quando Rui Rio vem dizer que o PSD não é um partido de Direita não está só a praticar a demagogia típica dos delirantes em tempo de eleições, está a escamotear a ansiedade fascista que Portugal contém. Depois de Cavaco Silva, o Salazar da nossa democracia, depois de Passos Coelho, o fanático castigador, o culpador do povo e atarefado empobrecedor, é preciso não esquecer que estamos à mercê de um Mundo cada vez mais infantilizado, destituído de conhecimento, com as escolas enfraquecidas, a comunicação boicotada por redes sociais complacentes com toda a mentira e desfaçatez. Neste Mundo de multidões dedicadas sobretudo à dimensão lúdica da vida, sem grande memória nem vergonha da ignorância, é fácil instalar regimes prepotentes alicerçados no ódio a grupos específicos. À deriva nos valores, sem dominar conceitos básicos, o cidadão eleitor é cada vez mais vulnerável e desmotivado para a política, a grande arte de garantir ou destroçar futuros.
Com Assunção Cristas a sepultar o CDS nas eleições que aí vêm, a Rio só restaria fazer a graça de parecer um bocadinho de Esquerda. Depois de ter estraçalhado a cultura no Porto, bastião último de uma política destituída de qualidade humana, torna-se confrangedor que pretenda convencer o país da sua valentia para quem tenha dois dedos de ternura. O homem que não se lembra muito bem de ter ido ao cinema e que não tem ideia de que filme terá visto, só nos apazigua por ser a carne que o partido usa para um banquete que sabe bem não lhe competir.
Inegável que a qualidade deste Governo depende do compromisso a três. Com as falhas que se lhe possam apontar, nada nos valeria mais do que continuar a haver uma partilha. Possa a sorte ajudar para que volte a acontecer uma queridíssima "gerigonça", até uma mais intrincada. Junto a isso, importa que, claramente, cada partido ocupe o lugar que se lhe reconhece. Frontal nas suas ideias, para que ninguém vote em lobo sob a pele de um cordeiro.
*Escritor