A constatação que Pedro Silva Pereira, ex-ministro de José Sócrates, fez quando interveio no Congresso do Partido Socialista (PS) do passado fim de semana é, transformada em pergunta, a questão que vale um milhão de dólares: é este PS e designadamente o seu líder a "bandeira de esperança" que os portugueses desejam ver erguida o mais depressa possível?
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As sondagens (que valem o que valem, todos sabemos) deixam entender que Seguro e o PS ainda não conseguiram ganhar a confiança dos portugueses. Este facto é, por si só, bastante revelador: com o país e o Governo em frangalhos, seria natural que o PS estivesse já hoje bem distante do PSD. Por que razão, ou razões, não está?
Primeiro: porque o partido passou de um líder com alma (para o bem e para o mal, é justo dizê-lo) para um líder insonso, com pouco chama, incapaz de mobilizar pela palavra e pelo ato os corações dos socialistas. Seguro é cerebral onde Sócrates era visceral. Esta espécie de bonomia política tomou conta do PS. Foi ela, de resto, que causou o movimento falhado (para já) de António Costa.
Segundo: porque, por querer aparecer muito certinho e direitinho aos olhos dos portugueses, António José Seguro ainda não foi capaz de os sobressaltar, de os fazer acreditar que há substância no que propõe e futuro no que deseja. Numa palavra: a empatia que o líder do PS procura junto do eleitorado (sobretudo do flutuante, aquele que decide quem vence nas urnas) precisa de outra roupagem.
Tomemos o exemplo da criação de postos de trabalho. No Congresso, Seguro repetiu essa ideia. Encheu os pulmões com ar e disse que a prioridade é: emprego, emprego, emprego (assim, três vezes seguidas, para que não subsistam dúvidas). Ora, ninguém, em bom rigor, pode dizer o contrário. Mas pode - e deve - questionar-se: mas que tipo de emprego tem António José Seguro na cabeça?
Um engenheiro chegado à China reparou que muitos homens construíam uma represa à força de pás e picaretas. Questionou o responsável: por que não usam uma escavadora? Ouviu a resposta: porque assim destruiríamos muito emprego. O engenheiro ousou contrapor: se o objetivo é garantir mais e mais emprego, então o melhor é pôr os homens a trabalhar com colheres em vez de pás.
A caricatura, usada pelo professor José Manuel Moreira no livro "Leais, Imparciais & Liberais", serve para dizer o seguinte: a criação de trabalho não pode, ou não deve, ser vista como um fim em si mesmo, mas sim como um passo para chegarmos à criação de riqueza. Explicar aos portugueses como pensa o PS criar os empregos que têm mais valor para as pessoas é, creio, uma boa forma de mudar a roupagem, aproximando o discurso do que realmente interessa. É trocar a pá pela escavadora.