O país viu partir um dos seus melhores cidadãos. A sua idade e a vontade de viver parecia que o faziam eterno nesta vida terrena. A perspicácia que tinha para o pormenor fazia-o único na relação humana.
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Tinha uma capacidade extraordinária de conseguir apreender, de uma forma autodidata, aquilo que muitos precisavam para frequentar a Universidade, ainda assim acabou, em Coimbra, doutor honoris causa. Estou a falar de alguém que comecei a admirar ainda muito jovem e que me ajudou a compreender a essência de ser empresário longe daquela dicotomia da luta de classes.
Um dia, já depois de ter acompanhado a sua entrada na portuense Confraria das Tripas, em plena crise das vacas loucas, graças a um amigo comum, o Henrique Brandão, tive oportunidade de, pelo telefone, voltar a trocar impressões com ele. Queria ajudar a resolver um problema. Fiquei espantado e admirado com aquela sua simplicidade de abordar o assunto, cuja solução não era para ele, mas para uma família. Depois de se ter resolvido o referido problema voltou a falar-me, agradeceu e convidou-me para o visitar na sua terra de Campo Maior.
Um dia, já depois de me ter enviado a sua autobiografia com uma simpática dedicatória, acabei por aceitar o seu convite e rumar ao seu mundo. Nesse fim de semana prolongado tive oportunidade de seguir, de perto, a preocupação social daquele Homem. A sua fábrica parecia um hospital da forma como estava limpa e os seus trabalhadores eram espontâneos no elogio. A mecanização da mesma não tinha conduzido à saída de ninguém. Aquilo era uma verdadeira família onde imperava uma sustentável coesão social e económica. Vi e senti falarem dele com respeito e admiração. Era alguém que soube resistir à venda do seu grupo, para uma multinacional, não deixando que o centro de decisão saísse do interior de Portugal. Pude compreender como estava atento a todos os pormenores. Quando, no final de uma sexta-feira, nos convidou a visitar o seu escritório, observei como geria tranquilamente todo o negócio e como se lembrou de minha mulher com uma generosa recordação de um bago de café em ouro. O comendador Nabeiro era assim mesmo. Alguém que percebia que, independentemente da transformação tecnológica e digital, o homem tem uma dimensão social. Tinha uma história que se consubstancia na confiança e no auxílio ao outro. Ele acabou, assim, por ser um apóstolo nos dias de hoje.
Tinha uma visão do seu negócio, uma ideia de Portugal, um sentido social da partilha e uma vontade que misturava a simpatia com o desejo de servir. Vamos todos sentir a sua falta e connosco fica o seu exemplo.
Professor Universitário de Ciência Política