O lançamento, esta semana, da Plataforma "Uma Agenda para Portugal", iniciativa criada a partir do Porto, abalou o PSD para lá do previsível. O sinal mais evidente? Depois de uma estridente deputada "laranja" ter gritado que os "barões" do partido têm de ir a votos se quiserem tomar conta da casa, Passos Coelho sentiu necessidade de responder a um facto que, num instante, ganhou dimensão. Disse que conta recandidatar-se à liderança do PSD "dentro de muito pouco tempo" e que via com "bons olhos" iniciativas como esta, nascidas dentro do partido que comanda. Sem querer, Passos deu à Plataforma a visibilidade que esta procurava. Os promotores agradecem. E os detratores de Passos também.
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As evidências aconselham a que o primeiro-ministro mantenha os olhos bem abertos. Sendo verdade que o nome de Rui Rio é há muito apontado como challenger e/ou sucessor de Passos, não é menos verdade que esta é a primeira vez que se desenha um movimento com caráter (aparentemente) orgânico de apoio ao caminho que o ex-autarca do Porto tem de fazer rumo à liderança do partido, ou do Governo, ou mesmo da presidência da República.
Rui Rio pode estar ainda em "modo cauteloso", mas - nova evidência - não se demarcou clara e inequivocamente das leituras políticas suscitadas pelo aparecimento da Plataforma. Ou seja: Rio está a dizer que, apesar de tudo, já esteve mais "cauteloso". Vale o mesmo dizer: somando a isto o verdadeiro "road-show" que o ex-presidente da Câmara fará, até ao final do ano, pelo país, participando em debates e conferências, fica claro que Rio lança um sinal em direção a Passos.
A discussão sobre as perdas e ganhos deste movimento é interessante. Não é cedo de mais para Rio se meter ao barulho, permitindo que o seu nome seja usado nesta trama? O ruído beneficia-o mais do que o prejudica? O avanço extemporâneo não permite que as tropas se realinhem contra ele? Não pode ele ser acusado de estar a causar um foco de instabilidade no partido e no Governo no exato momento em que o país pede serenidade? Tudo se reduz à pergunta: porquê agora, se o calendário (diretas no PSD, eleições europeias, fim do programa de assistência financeira, etc...) aconselha calma e prudência?
Creio que Rui Rio e apoiantes estão a apostar todas as fichas no facto mais marcante da atual vida política portuguesa: a imprevisibilidade. Um novo amuo de Portas, uma nova intransigência de Passos, uma nova decisão do Tribunal Constitucional, uma nova exigência de austeridade da troika chegam, juntas ou separadas, para que tudo abane de novo. Se isso acontecer, Passos acaba. E Rio começa. Convém que Rui Rio tenha um milagre no bolso para salvar o país. E a sua imagem, que, para o bem e para o mal, foi construindo, com cuidado, no país.