Corpo do artigo
Os britânicos são gente curiosa. Apesar de submersos num mar de imigrantes, vão buscar forças, sabe Deus onde, para manterem um invejável sentido nacional. Sentido nacional esse que, apesar de colocar o interesse próprio acima de tudo, manias e costumes incluídos, não deixa de se aprestar ao serviço dos grandes ideais. E quem não gosta destes insulares arrogantes não pode esquecer-se do sacrifício que assumiram, por todos nós, em momentos de excruciante negritude universal.
Dito isto, não me surpreendem os resultados das eleições. Posso estar completamente enganada, mas aquela gente do chá das cinco, do guarda-chuva, da rainha e do futebol (e há-os com turbante, com chador ou com chapéu de coco) ao sentir o perigo da incerteza, do desaparecimento de um sistema bipartidário cujas manhas já conhecem, mobilizou-se e retomou com força, clareza e espaço zero para desculpas de ingovernabilidade, o bom e velho mandato que agora foi Tory para a seguir ser Labour.
Os britânicos gostam de clareza. Pode correr tudo mal, mas sabem a quem vão pedir contas. Até pode ser que os Milliband ou Clegg que se seguem venham a ter um apoio futuro significativo. Mas terá de ser tão significativo que quem o obtiver será quem responderá pelo que fizer.
Portanto, por agora, David Cameron terá de se desembaraçar de vários dossiers complicados, o primeiro dos quais será o prometido referendo sobre a permanência na União.
Como diz a letra do hino "Britons shall never, never, be slaves", não é difícil criar um movimento forte de apoio à recuperação da autonomia perdida sobre uma série de matérias, desde a livre circulação de bens e serviços, às leis da concorrência. Tudo isto com o agrado orçamental da anulação das respetivas contribuições.
Cameron não pode, agora que um discurso mais radical da ala mais conservadora do seu partido não lhe dá jeito, titubear. Tem de encontrar argumentos muito sérios para esfriar ou mesmo anular esta possibilidade de secessão.
Não tenho dúvida de que os malfadados mercados financeiros e a sua praça mais emblemática serão chamados, ironia das ironias, ao nobre papel de salvadores da União. E os britânicos serão os primeiros a rir-se deles próprios.
David Cameron terá de se desembaraçar de vários dossiers complicados, o primeiro dos quais será o prometido referendo sobre a permanência na União