A corrida às legislativas do próximo ano entrou definitivamente na agenda. Na última sexta feira, António Costa apresentou a sua moção; ontem, Marco António Costa assestou as baterias sobre o líder socialista e Cavaco Silva desfez as dúvidas sobre a data do ato eleitoral. A partir daqui, é a doer.
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O Presidente da República deu uma entrevista ao "Expresso", onde voltou à necessidade de uma cultura de diálogo entre os partidos. Queixou-se da permanente crispação, aliás bem patente nos debates quinzenais do Parlamento, e propôs pela n-ésima vez os entendimentos relativamente a questões estruturantes da governação. Este é um apelo recorrente por parte de Cavaco Silva, que todavia não teve jamais qualquer recetividade entre os partidos do Governo e da oposição. Voltar a insistir nesta altura do campeonato político é pouco mais que letra morta.
Já em relação à possibilidade de antecipação das eleições, o presidente deixa claro que não irá por aí. A combinação de calendários de legislativas e presidenciais não dá brechas temporais para algo que, de todo o modo, Cavaco não deseja. As dificuldades em fechar a proposta de Orçamento do Estado para 2015 motivaram alguns setores da oposição a exigir, de novo, a antecipação. Não vejo que tal tivesse, nesta altura, qualquer utilidade para o país e a verdade é que tal não vai acontecer.
Posto isto, os calendários estão definidos. Do lado socialista, António Costa vai ainda cumprir um pró-forma, que é a sua eleição para secretário-geral. Na apresentação da moção ao XX Congresso Nacional do PS, o candidato a primeiro-ministro tratou de delimitar o espaço político. Dentro do partido, tem feito questão de incluir parte do exército de António José Seguro. Já na sua envolvente política, desferiu ataques para ambos os lados. À direita, estigmatizou o sonho da maioria (um Governo e um presidente), algo que, nas suas palavras, foi mais um "pesadelo". À esquerda, demarcou-se do "sectarismo anti-PS" que caracteriza o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda. Restam os micromovimentos da esquerda, como o Livre e o Fórum Manifesto.
Neste posicionamento, António Costa parece desdizer-se em relação ao que afirmara aquando das primárias. Na altura, o enunciado era de "não exclusão" de qualquer força política. A verdade é que, a partir do momento em que começa a pedir ao eleitorado uma maioria absoluta, aliás encorajada pelas últimas sondagens conhecidas, o líder socialista tem de fazer esta demarcação, de forma a capitalizar todos os votos possíveis. O que acontecerá depois das eleições decorrerá dos resultados, e aí não duvido que Costa regresse à versão inclusiva, até pela cultura de compromisso que tem protagonizado na Câmara de Lisboa.
O desenho da estratégia de Costa até às eleições tem, de certa forma, desapontado comentadores e jornalistas, que naturalmente anseiam por conhecer as suas propostas relativamente às questões mais próximas da governação. Em termos de comunicação, a tentativa de desacoplar a agenda para a década do programa de governo, este previsto só mais lá para a primavera de 2015, torna difícil o diálogo com os média. Mas onde provoca verdadeira desorientação é no Governo e nos partidos da maioria. Ao não abrir o jogo, o líder socialista retira referências aos opositores, que assim não têm sabido ajustar a mira por ausência de alvo.
Neste quadro, em que o combate político convencional se torna mais difícil, PSD e CDS têm optado por operações de "guerrilha", como foi o caso do discurso de ironia do ministro da Economia, por sinal pouco feliz, sobre as opções do ainda presidente da Câmara de Lisboa em matéria de taxas municipais. Por sua vez, Marco António Costa, o porta-voz do PSD, resolveu quantificar, de forma pouco rigorosa, os custos das "promessas" do líder socialista. Em entrevista ao "Diário de Notícias", avança com um número de 800 milhões de euros, numa tentativa de levantar já o papão do despesismo.
Nesta caminhada rumo às legislativas, que será atribulada, Governo e oposição vão esgrimir argumentos e números. Os últimos anos mostraram que, neste combate, foram demasiadas as vezes em que se faltou à verdade. Veremos se assim será também no próximo ano.