Está à vista de todos que o ano passado ficou marcado por uma acentuada queda do poder aquisitivo dos salários, uma vez que o aumento dos preços, que se situou nos 7,8%, contrasta com a queda de poder de compra.
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Esta perda supõe voltar à casa de partida em matéria de recuperação salarial, já que o salário médio dos portugueses está quase em níveis semelhantes ao que foi experimentado ao longo do pedido de resgate de Portugal no início da década anterior. Com uma única diferença: o salário mínimo nacional subiu, desde 2016, mais de 45%, o que atenuou de alguma forma a crise em que se encontrava a maior parte das famílias. O acordo de rendimentos alcançado no final de 2022 entre o Governo e as associações patronais para o aumento plurianual dos salários até 2026 é um sinal de estabilidade, mas que não nos deixa descansados porque está assente em pressupostos que dificilmente serão atingidos, como chegar a uma inflação de 2% a médio prazo ou um crescimento da produtividade de 1,5% até 2026. Para este ano, estão prometidos aumentos salariais de 5,1%, que depois vão baixando até 4,6% em 2026. Apesar destas previsões otimistas, quando se prevê uma recessão técnica na Europa, a verdade é que não existe uma distribuição equitativa dos custos de uma crise inflacionária. Vê-se que os trabalhadores são os mais prejudicados e as empresas apontam para um forte crescimento dos lucros. E o caricato é que foram, e continuam a ser, as margens de lucro das empresas que mais contribuíram para a crise inflacionária, enquanto que os salários tiveram o efeito contrário de moderar os preços. Se Portugal não viu uma maior inflação no ano passado, isso deveu-se, em boa parte, ao sacrifício dos trabalhadores. E as consequências estão à vista: a perda de poder de compra afeta o rendimento disponível das famílias, que por sua vez afeta o consumo interno. E um consumo interno debilitado afetará, igualmente, um crescimento económico "poucochinho". Num país em que a taxa de risco de pobreza ou exclusão social é de 22,4%, a situação ainda é mais grave.
*Editor-executivo