São as regiões, estúpido!
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Quando, em plena campanha para as presidenciais americanas de 1992, Bill Clinton se viu confrontado com níveis de aceitação de 90% do seu adversário e presidente em exercício George Bush (pai), sabia que precisava de um "game changer". Foi assim que decidiu secundarizar a omnipresente política externa e focar-se no essencial dos problemas das pessoas, lançando mão do famoso slogan "É a economia, estúpido!". Aposta ganha, já que se tornou no 42.º presidente dos EUA, abrindo um sólido período de expansão económica.
Este slogan tem sido adotado na política para recordar a necessidade de endereçar o essencial das questões. E é justamente esse o meu propósito de hoje, aproveitando a divulgação recente de duas importantes realidades estatísticas, que de novo deixam Portugal muito mal na fotografia.
Vamos então aos factos. A OCDE divulgou um relatório onde conclui que a desigualdade entre ricos e pobres está em níveis recorde em Portugal. Na distribuição de rendimentos, sintetizada pelo coeficiente de Gini, somos o sétimo pior da OCDE e um dos piores da UE28. O relatório é ainda categórico na afirmação de que a maior desigualdade é um entrave para a saída da crise e para o desenvolvimento harmonioso de países e sociedades. Entretanto, ficámos também a saber pelo Eurostat que também ao nível das regiões a desigualdade em Portugal é gritante. Os 16.900 euros de PIB per capita do Norte em 2013 são apenas 59% dos 28.800 euros de Lisboa. Acresce que o Norte, que é o campeão das exportações de bens, aliás abundantemente exploradas na propaganda do Governo, continua entre as mais pobres regiões da Europa, ultrapassando apenas umas quantas da Grécia, Polónia, Hungria, Roménia e Bulgária. Já agora, as restantes regiões portuguesas não estão muito melhor no ranking.
E aqui está o essencial. As políticas prosseguidas pelos diferentes executivos em Portugal têm contribuído para a cristalização de mecanismos de distribuição de riqueza demasiado imperfeitos, quer do ponto de vista social quer do ponto de vista geográfico. E, inequivocamente, estas duas dimensões não são independentes. A ausência de um modelo de territorialização do desenvolvimento, que mobilize a inteligência, os recursos e a capacidade de governança regionais, tem acentuado de forma despudorada as desigualdades e inibido o crescimento da economia. Essa é a razão objetiva pela qual a nossa retoma é sempre mais sofrida, como se estivéssemos condenados a um plafonamento do desenvolvimento. São as regiões, estúpido!