O Serviço Nacional de Saúde faz parte do restrito grupo de áreas das quais Portugal se pode orgulhar. É uma das conquistas-marca pós-25 de Abril e está catalogado pelas organizações internacionais como um dos melhores à escala mundial.
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Se a eficácia do sistema não se discute, outro tanto não se passa quanto à sua sustentabilidade. Todos e quaisquer ângulos de abordagem ao Sistema Nacional de Saúde afunilam, de facto, na incapacidade financeira do Estado em o viabilizar, não obstante os portugueses estarem cada vez mais fustigados com uma fortíssima bateria de impostos.
O défice do Serviço Nacional de Saúde é construído, com certeza, por erros de planificação, falta de coragem política para pôr cobro a mordomias, défice de capacidade de convencimento das populações para a necessidade de optimizar serviços - decidindo-se pelo encerramento de alguns deles, juntando-se a eficácia clínica à redução de despesas. E a realidade é incontroversa, não obstante os cantos de sereia dos apologistas de um Serviço Nacional de Saúde intocável: sem novas fórmulas de financiamento, é impossível, por um lado, manter o conceito universal e, por outro, a qualidade do sistema.
É dos livros: as concepções ideológicas podem ser benignas, mas a realidade trata de as tornar... razoáveis.
Ora, encaixam neste princípio basilar algumas decisões recentes do ministro da Saúde, Paulo Macedo. A tentativa de fazer reajustamentos nos serviços sem perda de eficácia, obtendo simultaneamente fontes adicionais de receita atenuadoras de um gigantesco défice, só não é compreensível por quem teima em viver sob o signo da mentira das últimas décadas, isto é, fazendo figura de rico de bolsos repletos de cotão.
O anunciado aumento das taxas moderadoras para quem vai às urgências dos hospitais ou aos centros de saúde é paradigmático. Os 100 milhões de euros de encaixe adicional previsto são uma pequeníssima ajuda aos cofres de um ministério na bancarrota, mas, ainda assim, estão a provocar protestos de legitimidade... duvidosa.
O agravamento das taxas moderadoras não é agradável, mas pauta-se por princípios elementares de justiça. Estima-se entre cinco e seis milhões o número de portugueses que por elas não serão abrangidos. Crianças até aos 12 anos de idade, portadores de doenças crónicas e cidadãos de baixíssimos rendimentos permanecerão isentos de qualquer pagamento. No somatório, esta "janela" de isenções é inatacável.
As reclamações acabam, no fundo, por basear-se em princípios filosóficos gerais, só que inconsequentes perante as dificuldades do país. É sempre possível reclamar, ser do contra. E até faz sentido uma pergunta, primária: afinal, para que se pagam impostos? E o busílis reside exactamente na resposta: os portugueses legitimaram nas últimas décadas governantes gastadores do dinheiro onde não deviam, entre o sumptuário e o estapafúrdio - fizeram pior: investiram o que o país não tinha e hipotecaram as próximas gerações. Agora, não há remédio. Assim como assim, no caso da Saúde resta, para já, a preocupação de não causticar os mais desafortunados...