Umas dezenas de automobilistas juntaram-se, ontem, durante pouco mais de meia hora, para protestarem contra a introdução de portagens na A29, entre Gaia e Ovar. O mais que se ouviu foram uns buzinões estridentes. O mais que se viu foi a ocupação das duas faixas de rodagem, com os carros a circular a baixas velocidades. O povo é pacífico. Pelo menos por agora...
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A discussão sobre a introdução de portagens nas vias sem custos para o utilizador (Scut) já há muito saiu do adro. Mas a procissão ainda está longe de chegar ao fim. A delicadeza do tema obrigou, como se sabe, à sucessiva marcação e desmarcação de datas para a entrada em vigor do sistema de cobrança. Dificuldades técnicas, redefinição dos contratos com as concessionárias, apaziguamento dos sucessivos protestos, tudo serviu de argumento na anterior e na actual legislatura.
Desta vez será de vez? O ministro das Obras Públicas jura que sim. Já há data marcada para a entrada em vigor do novo peso no bolso dos visados: 1 de Julho. Argumentos a favor existem aos montes, quase tantos como os argumentos contra mais esta "taxa" de circulação. Sobra apenas um pequeno problema: o fim das famigeradas Scut é para todos ou somente para alguns? A resposta, aposto singelo contra dobrado, será: é para todos. Mas às pinguinhas. Vale o mesmo dizer que, por muito que argumentem com o peso turístico da região e com a falta de alternativas, mais cedo do que tarde os algarvios também vão dar para este mealheiro. É, de resto, isso que o PSD tem defendido com clareza. Como é, de resto, isso que o Governo tem deixado passar de fininho, sem clareza, para a opinião pública mais atenta.
De modo que não vale a pena voltar a discutir as virtudes, ou a falta delas, da introdução de portagens nas Scut. Resta apenas lamentar que, neste como em tantos outras temas que vão sempre bater aos nossos já depauperados orçamentos, a verdade não seja contada, toda, de fio a pavio.
Santana Lopes (que, como prometeu, continua a andar por aí) disse há dias numa estação televisiva que o Executivo de José Sócrates "mete dó". Trata-se, obviamente, de um exagero, de um soundbite à medida de um ex-primeiro-ministro que, ele sim, liderou um governo que chegou a meter "dó". Mas, descontada a verrina que a frase contém, há um lado certeiro na intervenção de Santana. O evidente estado de periclitância do actual Governo não tem só como causa a crise que lhe caiu em cima. A crescente sensação de deslassamento entre governantes e governados tem também muito a ver com a confiança que os segundos perderam nos primeiros. E, quando assim é, dizem os livros que o ocaso não está longe. As Scut são apenas o último exemplo desse inexorável truísmo.