É contra os meus princípios falar duas vezes da mesma coisa, mas acho que é altura de chamar a atenção à TVI para a falta de pudor com que se serve da miséria para fazer caridade a troco de publicidade. Cheguei a julgar que a história a que me referi de exibir um casal pobre e de lhe oferecer uns carrinhos de hipermercado e uns electrodomésticos era caso único, desculpável pela época natalícia - mas afinal o degradante espectáculo veio para ficar. E só volto a ele porque passou das marcas. Uma coisa é mostrar adultos que choram em público a troco de umas prendas, outra coisa é exibir menores lavados em lágrimas depois de contar como haviam escrito à TVI a pedir esmola. Não há uma Comissão de Protecção de Menores encarregada de defender isso mesmo, justamente os menores, de todo o tipo de agressão, nomeadamente a agressão à imagem? Os jornais, quando incluem fotografias em notícias de matéria delicada, têm o cuidado de borrar o rosto das crianças, para não serem identificadas. Não terá a TVI pensado que a menina que apareceu no tal programa verá, na escola, os colegas apontá-la a dedo e a dizer «Olha, lá está a desgraçadinha com os ténis de básquete que a TVI lhe deu de esmola!». Se naquele canal não há quem conheça a lei, bom seria que a Lei o ensinasse...
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Com a crise que aí está e mais virá, porém, o que menos falta nos programas televisivos são telefonemas de pessoas a chorar que ganham uma pensão ou rendimento social de miséria e têm de pagar tanta coisa que ficam sem dinheiro para remédios ou mesmo para comer. E vejo os apresentadores dos programas mostrar o conveniente ar compungido. Todos eles ganham largos milhares de euros (dezenas de milhar num caso ou outro, é o que consta. Mas decerto que todos eles, quando as luzes se apagam, já não pensam nos lamentos que ouviram... Mas eu penso!
