Corpo do artigo
Estando o país de pantanas, o Partido Socialista (PS) é hoje um dote muito desejado - e não falta quem o tente desvalorizar. Ao longo dos anos, o dote - referência de Democracia e Liberdade - tem passado por várias gerações de proprietários, chamemos-lhes assim, incluindo-se neles alguns incapazes de o usarem sem ser pela via dos comportamentos megalómanos perniciosos para a maioria da comunidade envolvente.
Recebedor ainda fresco da herança, a António José Seguro está reservado na atualidade o papel de tentar recuperar a imagem e a mais-valia do tal dote. E está-lhe destinado o papel difícil de dispor da capacidade de convencimento do mercado, isto é, dos eleitores, em contraponto às invejas da "família" e às manhas de todos quantos não desistem do golpe do baú.
Todos os cuidados são poucos, naturalmente. E exigem responsabilidade. A posição de António José Seguro não está fácil.
Os cânticos de sereia da direita, por um lado, são pungentes e, para cúmulo, os mais recentes acordes saem compassados pela batuta de um maestro revestido de autoridade - o presidente da República. A ideia de disponibilizar o pote para recuperação comunitária de um bem comum estilhaçado contém riscos. E o temor passa pela clara consciência geral de que o anterior detentor do bem testamentário foi quem desbaratou confiança e credibilidade. Que fazer, então? Ajudar à emenda dos erros a cuja origem a "família" mais chegada não foi indiferente?
A complexidade da dúvida aumenta na exata dimensão imaginária de uma tenaz. A esquerda há muito percebeu dispor de uma única via alternativa para a sobrevivência do seu posicionamento entre a fantasia e o contra: desvalorizar o pote, ou seja, o PS. Envolvê-lo numa teia de menorização de influência seria sempre rentável. Tentar, tentar, é a palavra de ordem. Daí ao blá-blá de atração é um pequeno passado. E se o PCP, ortodoxo e construído de esforço e rugas, já não insiste em tretas, outro tanto não se passa com o Bloco de Esquerda, composto por um ADN de intelectualidade urbana. Sim, é mais fácil a Seguro percebê-los, mas cautelas e caldos de galinha aconselham ao afastamento da proposta baseada em teoria antropófaga travestida. O arraso dado às intenções do Bloco de Esquerda na sequência de uma reunião ontem é bom sinal....
Seguro tem ainda um terceiro problema para não banalizar (ainda mais) o pote: a discórdia e os ameaços no seio da família socialista. E embora possa parecer o contrário, esse é o grande nó a desatar. Sendo certo que, como na vida de todos nós, há familiares a quem não se deve passar o mínimo de cartão. E se contribuíram para delapidar património......
Não é simples a Seguro escolher o caminho. A opção fica no entanto simplificada se optar pela audácia. E ela passa por ir contra os ideais antropófagos e a "família".