<p>Uma greve sem aviso tem um nome - greve selvagem. E é isso mesmo: uma selvajaria. Em pleno século XXI, ninguém, no seu bom-senso, admitirá como possível que um importante sector de actividade entre em greve sem pré-aviso, afectando a segurança do Estado, o seu bom nome e a sua economia. Aconteceu em Espanha, com os controladores aéreos, que, com a sua atitude, paralisaram o país, puseram em estado de sítio cerca de 600 mil viajantes, obrigaram o Governo a medidas extremas e atraíram sobre si a raiva e a incompreensão de muitos milhares de pessoas. </p>
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Saberão os grevistas o que fizeram e porque o fizeram. Mas em democracia, não se admite uma chantagem como esta. Nada a justifica, nem mesmo o agravamento da carga horária que o Governo de Madrid lhes terá imposto. A militarização do espaço aéreo deixa, agora, os que persistirem na greve ilegal em maus lençóis e a mão de Zapatero será previsivelmente dura para com os grevistas.
Num momento em que os países atravessam uma crise dura, num momento em que se pede a patrões, sindicatos e governos que sejam capazes de criar plataformas de entendimento, o sinal dos controladores aéreos espanhóis é perigoso. Os países em crise necessitam de consensos, e não de atitudes tão extremistas como esta.
Mas Portugal também tem, de onde menos se esperaria, sinais de outro tipo de selvajaria. A decisão do Governo açoriano, liderada por um socialista, facto só assinalável por o Governo central ter a mesma cor, de compensar alguns funcionários públicos pelo corte que Governo da República determinou nos salários do funcionalismo público é muito mais do que uma afronta ao Governo de Sócrates. A circunstância de se tratar de uma compensação, de uma reposição de valores e não de uma isenção, inscreve-se na categoria da "habilidade", a que estávamos habituados por parte de Alberto João Jardim, na Madeira, e que Carlos César agora replica nos Açores. Tudo isto será legal, democrático, constitucional. Mas é perfeitamente selvagem na medida em que desrespeita uma norma tomada em tempo de crise, abrindo demagogicamente uma excepção que mostra com toda a evidência que, sendo todos nós iguais, há uns mais iguais do que outros. E que mostra como em tempo de crise há sempre ratos prontos a abandonar o navio mandando às malvas a solidariedade.
O pior que isto tem é que vivemos num país em que se abrem demasiadas excepções. Mas é bom que quem abre tais excepções, vá sabendo que fica à margem da consideração geral, que se expõe à classificação de dirigente não desejável numa democracia e que se integra por vontade própria, expressa em actos execráveis, na categoria de cidadão de segunda, isto é, incapaz de um comportamento medianamente ético.
PS - Germano Silva, o "nosso" Germano Silva de "À descoberta do Porto", lançou, ontem, mais um livro. No caso do Germano, os livros são verdadeiras provas de amor pela cidade. O Porto já o distinguiu, mas a Câmara deveria dar a sua mais alta distinção a este homem que, como poucos, não querendo ser mais do que um divulgador, tanto já fez por esta cidade, desbravando-lhe as entranhas e dando-a a conhecer, sobretudo aos que aqui vivem e que, não tendo os seus olhos, não a vêem como ele, não lhe perscrutem todo o encanto e beleza.